HOMO SAPIENS_ O Conhecer Sensitivo e Intelectivo
O homem é um ser dotado de conhecimento: é ’homo sapiens’. Estruturaremos nossa abordagem do seguinte modo:
1. Fenomenologia do conhecer;
2. Psicologia das várias atividades cognitivas;
3. Principais características do conhecimento intelectivo;
4. Implicações antropológicas do conhecimento intelectivo;
5. Implicações antropológicas do conhecimento humano.
FENOMENOLOGIA DO CONHECER
Conhecer é ser consciente de alguma coisa. Conheço uma maçã quando a identifico ou quando estou consciente de certas propriedades a que chamo maçã.
O conhecimento humano abarca tudo de que o homem pode tornar-se consciente mediante suas faculdades sensitivas ou intelectivas.
De Platão m diante, quase todos os filósofos – Aristóteles, Agostinho, São Tomás, Bacon, Descartes, Lock, Hume, Kant – distinguem o conhecimento em 4 formas:
1. sensitivo
2. imaginativo
3. intelectivo
4. místico
CONHECIMENTO SENSITIVO
É aquele que se obtém através dos sentidos. Diz respeito às coisas materiais na sua singularidade e é amplamente estudado em nossas monografias.
A questão da ‘singularidade’ justifica-se porque colhemos essas impressões como uma qualidade, uma adjetivação de algo. Por exemplo: vejo essa ou aquela cor, essa ou aquela árvore, não a cor, a árvore. Ouço esse ou aquele assobio, e não o assobio.
Que importância tem o conhecimento que nos é fornecido pela visão, pela audição, pelo paladar, etc.?
É comum pelo enfoque metafísico de nossos ensinamentos atribuirmos pouco ou nenhum valor ao conhecimento oriundo dos sentidos, porém numa análise antropológica torna-se necessário identificar seu real valor.
Mesmo os platônicos, cuja linha mais coaduna com os ensinamentos rosacruzes, que sustentam uma origem inata do conhecer racional, devem admitir que o homem não pode tomar consciência desse conhecimento de outro modo a não sr mediante uma investigação por parte dos sentidos. A maior parte, porém, está de acordo com Aristóteles, o qual acreditava que a mente nasce como uma ‘tábula rasa’ e que no intelecto não existe nenhum conhecimento que não seja transmitido através dos sentidos.
Sabemos, como estudantes, que o conhecimento não pode ser completamente reduzido ao dos sentidos, porém reconhecemos neles o seu ponto de partida. Aquele que não possui a vista ou não ouve encontra-se na impossibilidade de formar certas idéias.
Vale lembrar que segundo vários filósofos a visão é o sentido mais importante, porque, por instinto, os homens desejam o saber e essa oferece maior contribuição ao conhecimento do que os outros sentidos.
CONHECIMENTO IMAGINATIVO
A fantasia é uma faculdade extremamente importante e característica do homem, mais pela sua função prático do que pela sua função especulativa. Ela serve como uma ponte entre os sentidos e a razão, porque com seus sonhos, seus projetos e suas visões utópicas, a fantasia alimenta aquele impulso de autotranscendência que move continuamente o homem e o empurra mais para o alto.
Segundo H.Cox, graças à fantasia o homem possui a capacidade de ‘reviver e de antecipar, de refazer o passado e de criar um futuro completamente novo. A fantasia é o húmus de onde se desenvolve a capacidade do homem de inventar e de renovar. A fantasia é a fonte mais rica da criatividade humana.”
CONHECIMENTO INTELECTIVO
Como ‘homo sapiens’, o homem raciocina e chega a certas idéias refletindo sobre outras, chega à existência de algo pela existência de outra coisa.
O homem sabe coordenar os conhecimentos de forma sistemática; divide-os, classifica-os segundo os seus argumentos e obtém, assim, teorias gerais para as várias esferas da realidade, como o quer a ciência.
Que capacidade maravilhosa!
É um re-flexo das coisa na mente do homem, já que esta última lhe conferiu amplitude. É o Ser se manifestando através dos entes no devir da existência ou, numa linguagem mais rosacruz, o Cósmico se expressando através de Nous.
Talvez a forma mais conciliável de se conceber uma TEORIA DO CONHECIMENTO seja constituí-la das duas grandes linhas que será tratada no conhecer místico.
CONHECIMENTO MÍSTICO
Ambos, platônicos e aristotélicos, têm razões suficientes para fundamentar que sua teoria é a mais fidedigna.
A primeira grande linha, a platônica, sustenta que a alma tem uma noção natural de todas as coisas, ou seja, o conhecimento é ‘anmnese’, é uma forma de ‘recordação’ daquilo que já existe desde sempre no interior de sua alma.
Acredita-se que a doutrina da ‘anamnese’ surgiu em Platão através de influências órfico-pitágoricas, segundo as quais a alma é imortal e renasce muitas vezes. Conseqüentemente, a alma viu e conheceu toda a realidade, a realidade do outro mundo e a realidade deste mundo. Sendo assim,m conclui Platão, é fácil compreender que a alma pode conhecer: ela deve extrair de si mesma a verdade que já possui desde sempre, e esse ‘extrair de si mesma’ é ‘recordar’.
Argumenta ainda Platão: com os sentidos, constatamos a existência de coisas iguais, maiores e menores, quadradas, circulares e outras semelhantes. Entretanto, com atenta reflexão, descobrimos que os dados que a existência nos fornece – todos os dados, sem exceção - não se equacionam jamais de maneira perfeita com as noções correspondentes que indiscutivelmente possuímos: nenhuma coisa sensível é ‘perfeitamente’ e ‘absolutamente’ quadrada ou circular, mesmo que possuamos noções de igual, de quadrado e de circulo ‘absolutamente perfeitos’.
Então, é necessário concluir que existe um certo desnível entre os dados da experiência e as noções que possuímos; as noções contêm algo mais do que os dados da experiência. Qual a origem, porém, desse algo mais? Se, como vimos, ele não deriva nem pode estruturalmente derivar dos sentidos, isto é, de fora, não podemos deixar de concluir que sua origem está dentro de nós. Entretanto, ele não pode provir de dentro de nós como criação do sujeito pensante, pois o sujeito pensante não ‘cria’ esse algo mais, apenas o ‘encontra’ o ‘descobre’; ele, ao contrário, se impõe ao sujeito objetivamente de forma absoluta, independentemente de qualquer poder do sujeito.
Conseqüentemente, os sentidos nos proporcionam apenas conhecimentos imperfeitos. Nossa mente [nosso intelecto], ao se deparar com os dados dos sentidos, voltando-se para a própria profundeza, quase dobrando-se sobre si mesma, encontra neles a ocasião para descobrir em si os conhecimentos perfeitos correspondentes. E, visto que não os produz, não resta senão concluir que ela os encontra em si e os extrai de si como algo ‘originariamente possuído’, ou seja, deles ‘se recorda’.
Hoje a solução platônica encontra poucos protestos, pois de outro lado, a segunda linha, a dos aristotélicos, sustenta que estamos profundamente convencidos de que as causas daquilo que ocorre neste mundo se encontram no âmbito do mundo e, portanto, que as causas do que ocorre no homem se encontram também no mundo e, sobretudo, no homem. Outra razão é a consideração de que, depois de tudo, o nosso conhecimento não é dotado daquele caráter de absoluta certeza, de imutabilidade, de eternidade que lhe atribuía Platão. Hoje estamos mais do que conscientes dos limites do nosso conhecer. Sabemos que ele é, em todos os casos, ‘finito e mutável’, parcial e relativo e que comporta sempre uma boa dose de opinião.
Ficam, pois, assim as coisas: admitindo o fato de um conhecer humano portador de um caráter intelectivo – isto é, não redutível aos sentidos e à imaginação – e excluída a possibilidade de explicar a origem, a priori, com uma intervenção extramundana, devemos concluir que a fonte de tal conhecimento se encontra no próprio homem. Essa fonte se chama intelecto ou, então, razão ou mesmo mente. Por meio dessa faculdade, o homem consegue tirar, a partir dos dados que lhes são fornecidos pelos sentidos, idéias gerais, juízos universais, sistemas de informação. Obtém isso com três operações distintas: aprendizagem, juízo e raciocínio.
Na aprendizagem, o intelecto abstrai a idéia universal; no juízo, associa ou mesmo separa duas idéias; no raciocínio, extrai uma nova idéia das idéias precedentes.
E para nós, rosacruzes, qual seria a mais aceitável?
Aquela que concilie as duas, pois sabemos que da fonte cósmica ou da mente universal flui a inspiração que ordena, organiza, ‘ilumina’ as informações obtidas através dos sentidos. Através de uma analogia simples, podemos por nossa própria conta e risco fazer algumas inferências: se de súbito nossa mente fosse tomada por uma iluminação cujo conteúdo fosse parco ou insuficiente, pouco teríamos para ‘iluminar’; e do mesmo modo, se adquiríssemos informações-dados, elementos a ponto desse aculturamento consistir num grande depositário, de nada valeria se não fosse organizado num todo inteligível por uma iluminação.
Portanto, o conhecimento místico é aquele ‘obtido’ pela experiência direta com o Divino. Aliás, a mística tem essa característica de conferir ao individuo a vivencia que possibilita a visão de todo, onde o fruto é colhido pela inspiração e é resultado, muitas vezes, de reflexão profunda.
A máxima de nossos ensinamentos sintetiza essa explicação:
“A verdade é o fruto da árvore do conhecimento e não a própria árvore.”
Afirmamos no inicio que o homem é homo sapiens – cabe recolocar a assertiva como homo sapiens-sapiens, qual seja, o homem que sabe e sabe que sabe, ou tem percepção de sua consciência.
O que torna possível essa façanha, essa consciência das coisas e essa consciência de si próprio?
Essa percepção tratada pela filosofia como a relação sujeito-objeto denominada auto-consciência, concebida não como uma mera associação de sutilíssimos graus de percepção [Hume], mas como autentica introspecção,e algo essencialmente imaterial, espiritual.
Depois de havermos examinado a natureza da autoconsciência, perguntamo-nos: Qual é o seu alcance? Que informações nos oferece com relação ao nosso ser? Na autoconsciência, o que alcançamos de nós mesmos? O que a autoconsciência nos diz que somos?
O estudo da autoconsciência dá-nos, segundo renomados pensadores, resultados acerca da natureza do ser do homem, tais como:
- o homem é autoconsciência; é um ser que pensa a si mesmo [Descartes, Fichte, Teilhard];
- o homem é um ser encarnado; é consciente de ter um corpo e todos os seus atos de autoconsciência são filtrados através do corpo [Aristóteles, Merleau-Ponty, Marcel];
- o homem é um ser social; ele conhece no encontro com os outros [Marx, Mounier, Buber, Marcel, Scheler];
- o homem é um ser finito: pois que nasce e morre, é consciente de que o seu EU não coincide com o Ser [Guardini, Wittegenstein, Adorno];
- no homem há uma profunda distinção entre o que é e o que pode ser: ele tem consciência de que o que é atualmente não é tudo o que pode e deve ser [Heidegger, Bloch];
- o homem é livre: ele sabe que é patrão do próprio ser, da própria vida, do próprio futuro [Sartre, Garaudy];
- é porém, um ser condicionado: depende da natureza e da sociedade no seu ser e no seu agir [Spinoza, Marcus, Lévi-Strauss];
- em certa medida, é também alienado: sente-se diferente, pior do que deveria ser [Hegel, Marx, Nietzche, Tilich, Hidegger];
- transcende a matéria, o tempo, o espaço, o absoluto [Platão, Aristóteles, Plotino, Fichte, Buber].
A autoconsciência realiza plenamente a si mesma, isto é, esgota a própria compreensão, somente abrindo-se até a percepção de Deus. Esta grande verdade sempre afirmada por uma das mais antigas, autorizadas e duradouras correntes filosóficas, a platônico-agostiniana [que tira sua origem de Sócrates ou Platão, prossegue com Plotino e Agostinho, e nos tempos modernos é validamente representada por Descartes, Leibnistz Hegel, Rosmini, Blondel, etc] parece ser a única resposta adequada ao movimento de auto-transcendência situada em cada conhecimento intelectual, em particular no conhecimento de tipo afetivo.
A capacidade de refleti, para nós estudantes rosacruzes, e principalmente termos concomitantemente a consciência de que estamos fazendo uma reflexão assumem um valor decisivo ao associarmos que tal capacidade se deve ao fato de que o nosso eu é percepção pura do Cósmico, é claro, microcosmicamente re-fletida.
O homem é um ser dotado de conhecimento: é ’homo sapiens’. Estruturaremos nossa abordagem do seguinte modo:
1. Fenomenologia do conhecer;
2. Psicologia das várias atividades cognitivas;
3. Principais características do conhecimento intelectivo;
4. Implicações antropológicas do conhecimento intelectivo;
5. Implicações antropológicas do conhecimento humano.
FENOMENOLOGIA DO CONHECER
Conhecer é ser consciente de alguma coisa. Conheço uma maçã quando a identifico ou quando estou consciente de certas propriedades a que chamo maçã.
O conhecimento humano abarca tudo de que o homem pode tornar-se consciente mediante suas faculdades sensitivas ou intelectivas.
De Platão m diante, quase todos os filósofos – Aristóteles, Agostinho, São Tomás, Bacon, Descartes, Lock, Hume, Kant – distinguem o conhecimento em 4 formas:
1. sensitivo
2. imaginativo
3. intelectivo
4. místico
CONHECIMENTO SENSITIVO
É aquele que se obtém através dos sentidos. Diz respeito às coisas materiais na sua singularidade e é amplamente estudado em nossas monografias.
A questão da ‘singularidade’ justifica-se porque colhemos essas impressões como uma qualidade, uma adjetivação de algo. Por exemplo: vejo essa ou aquela cor, essa ou aquela árvore, não a cor, a árvore. Ouço esse ou aquele assobio, e não o assobio.
Que importância tem o conhecimento que nos é fornecido pela visão, pela audição, pelo paladar, etc.?
É comum pelo enfoque metafísico de nossos ensinamentos atribuirmos pouco ou nenhum valor ao conhecimento oriundo dos sentidos, porém numa análise antropológica torna-se necessário identificar seu real valor.
Mesmo os platônicos, cuja linha mais coaduna com os ensinamentos rosacruzes, que sustentam uma origem inata do conhecer racional, devem admitir que o homem não pode tomar consciência desse conhecimento de outro modo a não sr mediante uma investigação por parte dos sentidos. A maior parte, porém, está de acordo com Aristóteles, o qual acreditava que a mente nasce como uma ‘tábula rasa’ e que no intelecto não existe nenhum conhecimento que não seja transmitido através dos sentidos.
Sabemos, como estudantes, que o conhecimento não pode ser completamente reduzido ao dos sentidos, porém reconhecemos neles o seu ponto de partida. Aquele que não possui a vista ou não ouve encontra-se na impossibilidade de formar certas idéias.
Vale lembrar que segundo vários filósofos a visão é o sentido mais importante, porque, por instinto, os homens desejam o saber e essa oferece maior contribuição ao conhecimento do que os outros sentidos.
CONHECIMENTO IMAGINATIVO
A fantasia é uma faculdade extremamente importante e característica do homem, mais pela sua função prático do que pela sua função especulativa. Ela serve como uma ponte entre os sentidos e a razão, porque com seus sonhos, seus projetos e suas visões utópicas, a fantasia alimenta aquele impulso de autotranscendência que move continuamente o homem e o empurra mais para o alto.
Segundo H.Cox, graças à fantasia o homem possui a capacidade de ‘reviver e de antecipar, de refazer o passado e de criar um futuro completamente novo. A fantasia é o húmus de onde se desenvolve a capacidade do homem de inventar e de renovar. A fantasia é a fonte mais rica da criatividade humana.”
CONHECIMENTO INTELECTIVO
Como ‘homo sapiens’, o homem raciocina e chega a certas idéias refletindo sobre outras, chega à existência de algo pela existência de outra coisa.
O homem sabe coordenar os conhecimentos de forma sistemática; divide-os, classifica-os segundo os seus argumentos e obtém, assim, teorias gerais para as várias esferas da realidade, como o quer a ciência.
Que capacidade maravilhosa!
É um re-flexo das coisa na mente do homem, já que esta última lhe conferiu amplitude. É o Ser se manifestando através dos entes no devir da existência ou, numa linguagem mais rosacruz, o Cósmico se expressando através de Nous.
Talvez a forma mais conciliável de se conceber uma TEORIA DO CONHECIMENTO seja constituí-la das duas grandes linhas que será tratada no conhecer místico.
CONHECIMENTO MÍSTICO
Ambos, platônicos e aristotélicos, têm razões suficientes para fundamentar que sua teoria é a mais fidedigna.
A primeira grande linha, a platônica, sustenta que a alma tem uma noção natural de todas as coisas, ou seja, o conhecimento é ‘anmnese’, é uma forma de ‘recordação’ daquilo que já existe desde sempre no interior de sua alma.
Acredita-se que a doutrina da ‘anamnese’ surgiu em Platão através de influências órfico-pitágoricas, segundo as quais a alma é imortal e renasce muitas vezes. Conseqüentemente, a alma viu e conheceu toda a realidade, a realidade do outro mundo e a realidade deste mundo. Sendo assim,m conclui Platão, é fácil compreender que a alma pode conhecer: ela deve extrair de si mesma a verdade que já possui desde sempre, e esse ‘extrair de si mesma’ é ‘recordar’.
Argumenta ainda Platão: com os sentidos, constatamos a existência de coisas iguais, maiores e menores, quadradas, circulares e outras semelhantes. Entretanto, com atenta reflexão, descobrimos que os dados que a existência nos fornece – todos os dados, sem exceção - não se equacionam jamais de maneira perfeita com as noções correspondentes que indiscutivelmente possuímos: nenhuma coisa sensível é ‘perfeitamente’ e ‘absolutamente’ quadrada ou circular, mesmo que possuamos noções de igual, de quadrado e de circulo ‘absolutamente perfeitos’.
Então, é necessário concluir que existe um certo desnível entre os dados da experiência e as noções que possuímos; as noções contêm algo mais do que os dados da experiência. Qual a origem, porém, desse algo mais? Se, como vimos, ele não deriva nem pode estruturalmente derivar dos sentidos, isto é, de fora, não podemos deixar de concluir que sua origem está dentro de nós. Entretanto, ele não pode provir de dentro de nós como criação do sujeito pensante, pois o sujeito pensante não ‘cria’ esse algo mais, apenas o ‘encontra’ o ‘descobre’; ele, ao contrário, se impõe ao sujeito objetivamente de forma absoluta, independentemente de qualquer poder do sujeito.
Conseqüentemente, os sentidos nos proporcionam apenas conhecimentos imperfeitos. Nossa mente [nosso intelecto], ao se deparar com os dados dos sentidos, voltando-se para a própria profundeza, quase dobrando-se sobre si mesma, encontra neles a ocasião para descobrir em si os conhecimentos perfeitos correspondentes. E, visto que não os produz, não resta senão concluir que ela os encontra em si e os extrai de si como algo ‘originariamente possuído’, ou seja, deles ‘se recorda’.
Hoje a solução platônica encontra poucos protestos, pois de outro lado, a segunda linha, a dos aristotélicos, sustenta que estamos profundamente convencidos de que as causas daquilo que ocorre neste mundo se encontram no âmbito do mundo e, portanto, que as causas do que ocorre no homem se encontram também no mundo e, sobretudo, no homem. Outra razão é a consideração de que, depois de tudo, o nosso conhecimento não é dotado daquele caráter de absoluta certeza, de imutabilidade, de eternidade que lhe atribuía Platão. Hoje estamos mais do que conscientes dos limites do nosso conhecer. Sabemos que ele é, em todos os casos, ‘finito e mutável’, parcial e relativo e que comporta sempre uma boa dose de opinião.
Ficam, pois, assim as coisas: admitindo o fato de um conhecer humano portador de um caráter intelectivo – isto é, não redutível aos sentidos e à imaginação – e excluída a possibilidade de explicar a origem, a priori, com uma intervenção extramundana, devemos concluir que a fonte de tal conhecimento se encontra no próprio homem. Essa fonte se chama intelecto ou, então, razão ou mesmo mente. Por meio dessa faculdade, o homem consegue tirar, a partir dos dados que lhes são fornecidos pelos sentidos, idéias gerais, juízos universais, sistemas de informação. Obtém isso com três operações distintas: aprendizagem, juízo e raciocínio.
Na aprendizagem, o intelecto abstrai a idéia universal; no juízo, associa ou mesmo separa duas idéias; no raciocínio, extrai uma nova idéia das idéias precedentes.
E para nós, rosacruzes, qual seria a mais aceitável?
Aquela que concilie as duas, pois sabemos que da fonte cósmica ou da mente universal flui a inspiração que ordena, organiza, ‘ilumina’ as informações obtidas através dos sentidos. Através de uma analogia simples, podemos por nossa própria conta e risco fazer algumas inferências: se de súbito nossa mente fosse tomada por uma iluminação cujo conteúdo fosse parco ou insuficiente, pouco teríamos para ‘iluminar’; e do mesmo modo, se adquiríssemos informações-dados, elementos a ponto desse aculturamento consistir num grande depositário, de nada valeria se não fosse organizado num todo inteligível por uma iluminação.
Portanto, o conhecimento místico é aquele ‘obtido’ pela experiência direta com o Divino. Aliás, a mística tem essa característica de conferir ao individuo a vivencia que possibilita a visão de todo, onde o fruto é colhido pela inspiração e é resultado, muitas vezes, de reflexão profunda.
A máxima de nossos ensinamentos sintetiza essa explicação:
“A verdade é o fruto da árvore do conhecimento e não a própria árvore.”
Afirmamos no inicio que o homem é homo sapiens – cabe recolocar a assertiva como homo sapiens-sapiens, qual seja, o homem que sabe e sabe que sabe, ou tem percepção de sua consciência.
O que torna possível essa façanha, essa consciência das coisas e essa consciência de si próprio?
Essa percepção tratada pela filosofia como a relação sujeito-objeto denominada auto-consciência, concebida não como uma mera associação de sutilíssimos graus de percepção [Hume], mas como autentica introspecção,e algo essencialmente imaterial, espiritual.
Depois de havermos examinado a natureza da autoconsciência, perguntamo-nos: Qual é o seu alcance? Que informações nos oferece com relação ao nosso ser? Na autoconsciência, o que alcançamos de nós mesmos? O que a autoconsciência nos diz que somos?
O estudo da autoconsciência dá-nos, segundo renomados pensadores, resultados acerca da natureza do ser do homem, tais como:
- o homem é autoconsciência; é um ser que pensa a si mesmo [Descartes, Fichte, Teilhard];
- o homem é um ser encarnado; é consciente de ter um corpo e todos os seus atos de autoconsciência são filtrados através do corpo [Aristóteles, Merleau-Ponty, Marcel];
- o homem é um ser social; ele conhece no encontro com os outros [Marx, Mounier, Buber, Marcel, Scheler];
- o homem é um ser finito: pois que nasce e morre, é consciente de que o seu EU não coincide com o Ser [Guardini, Wittegenstein, Adorno];
- no homem há uma profunda distinção entre o que é e o que pode ser: ele tem consciência de que o que é atualmente não é tudo o que pode e deve ser [Heidegger, Bloch];
- o homem é livre: ele sabe que é patrão do próprio ser, da própria vida, do próprio futuro [Sartre, Garaudy];
- é porém, um ser condicionado: depende da natureza e da sociedade no seu ser e no seu agir [Spinoza, Marcus, Lévi-Strauss];
- em certa medida, é também alienado: sente-se diferente, pior do que deveria ser [Hegel, Marx, Nietzche, Tilich, Hidegger];
- transcende a matéria, o tempo, o espaço, o absoluto [Platão, Aristóteles, Plotino, Fichte, Buber].
A autoconsciência realiza plenamente a si mesma, isto é, esgota a própria compreensão, somente abrindo-se até a percepção de Deus. Esta grande verdade sempre afirmada por uma das mais antigas, autorizadas e duradouras correntes filosóficas, a platônico-agostiniana [que tira sua origem de Sócrates ou Platão, prossegue com Plotino e Agostinho, e nos tempos modernos é validamente representada por Descartes, Leibnistz Hegel, Rosmini, Blondel, etc] parece ser a única resposta adequada ao movimento de auto-transcendência situada em cada conhecimento intelectual, em particular no conhecimento de tipo afetivo.
A capacidade de refleti, para nós estudantes rosacruzes, e principalmente termos concomitantemente a consciência de que estamos fazendo uma reflexão assumem um valor decisivo ao associarmos que tal capacidade se deve ao fato de que o nosso eu é percepção pura do Cósmico, é claro, microcosmicamente re-fletida.
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