Sabe-se que as doenças mentais são um dos sofrimentos mais comuns que afetam o ser humano. A depressão e a ansiedade são os sintomas mais freqüentes de condições que podem impedir severamente a eficiência e a felicidade das pessoas. Exaltação e impulsividade excessivas, alucinações e ilusões são outros sinais e sintomas de condições menos freqüentes porém comuns que estorvam a concretização do pleno potencial humano. Essas condições são tão comuns, que todos nós conhecemos pelo menos uma pessoa que delas sofre. Muitos de nós temos algum parente ou familiar nessas condições. E alguns de nós talvez estejamos lutando contra algum desses sintomas em nós mesmos. É freqüente que o primeiro passo para o autodomínio seja o de adquirir a capacidade de lidar com a doença mental.
Lidar com a doença mental envolve a compreensão em duas áreas: a natureza da doença mental e o que fazer a esse respeito.
A maioria dos sintomas de doença mental são extensões mais severas ou persistentes de sensações, emoções ou pensamentos naturais. É muito comum que pessoas mentalmente sadias sintam alguma preocupação e dúvida sobre tais sintomas, e temam que possam estar mentalmente enfermas e que um parecer ‘oficial’ possa confirmar sua preocupação. Por outro lado, é também bastante comum que pessoas mentalmente enfermas minimizem e neguem seus sintomas, evitando confronto consciente com a evidência de sua conclusão.
A distinção entre ‘normalidade’ e ‘doença’ é verdadeiramente vaga. A doença mental é definida em termos sociais. Diz-se que a doença mental existe quando sensações, emoções ou pensamentos comuns são tão intensos ou persistentes, que a pessoa é incapaz de operar adequadamente nas atividades comuns da vida. Lidar com as doenças mentais, portanto, é efetivamente uma questão de saber lidar com os sintomas, as crenças e o comportamento de pessoas que, por razões individuais, estão sobrecarregadas de uma intensidade incomum de experiência subjetiva ‘normal’.
Experiência Subjetiva Intensa
A maioria de nós deseja experiência subjetiva intensa...desde que prazerosa. Poucos de nós acharíamos que o prazer intenso é um ‘peso’. Antes, o prazer intenso é um alvo muito almejado da experiência objetiva. Analogamente, evitar o intenso desprazer ou a dor é um atributo universal da personalidade humana. Tanto prazer como dor são essencialmente atributos subjetivos do eu mundano, da individualidade subjetiva. A excessiva dedicação de tempo, energia e consciência à busca de prazer ou a evitar a dor pode se tornar uma grande sobrecarga para os recursos da individualidade objetiva. Quando muito sobrecarregada, a individualidade objetiva deixa de dirigir com eficiência as necessidades da realidade objetiva, e essa é a definição social de doença mental.
Para lidar com a doença mental é preciso primeiro compreender as limitações da individualidade objetiva. A individualidade objetiva geralmente se relaciona exclusivamente com o mundo da experiência emocional e física comum. Sem a consciência de algo maior que o próprio ego, a experiência mundana será assimilada como uma experiência física contínua., forçosa e hostil. As chances de dor parecerão grandes e as de prazer pequenas. Em quase todas as atividades, a pessoa será motivada a procurar o prazer e evitar a dor, ao passo que, com a consciência de um Eu maior, a personalidade-alma, é possível a paz, a beleza e a harmonia, que não dependem de forças controladoras da natureza física. A dor e o prazer não são recusados; são reduzidos,em proporções corretas, a meras condições objetivas.
O autodomínio é o único meio de lutar com a doença mental da própria pessoa e também das outras.
Mudando Outra Pessoa
Quando nos deparamos com o comportamento desarmonioso ou a inquietação emocional duma pessoa acometida por doença mental, nosso primeiro impulso é fazer algo para que ela mude. De modo geral, bastam duas tentativas para compreender que o esforço não é muito eficiente. O fundamento disso fica mais evidente quando compreendemos que cada um de nós é uma sutil porém poderosa expressão de um Eu superior e de um Eu inferior. Ao tentarmos mudar outra pessoa, nossa atenção se volta principalmente para o Eu inferior, a personalidade objetiva, que exibe a condição de doença mental.
Nosso segundo impulso é tentar produzir uma mudança na outra pessoa, motivados conforme a perspectiva de nosso Eu superior. Aspiramos curar a doença mental, ou levando o indivíduo a tomar consciência de seu Eu superior, ou buscando invocar pensamentos de cura. Uma vez mais, porém, somos traídos pela atenção no eu inferior, a qual, ao julgarmos que o Eu necessita ser curado, apenas reforça a importância dele.
Em outro nível, lidar com doenças mentais consiste num desafio para o autodomínio. Segundo esse critério, a atenção não se prende a mudar a outra pessoa, mas a conseguir a paz harmonia ante os mais intensos tipos de experiências mundanas. Quando o temor, a raiva, o ódio e o desespero perdem o poder de evocar sua contra-parte e deixam de diminuir a compaixão, a doença mental começa a desaparecer. A atração inata pela paz, beleza e harmonia existentes no ser humano desperta e estimula a automotivação de cura. Cada encontro com a inquietação de outros que estão perdidos na intensidade da experiência mundana constitui uma oportunidade de recordarmos nosso próprio apego a ilusão e coisas insignificantes, de dissolvermos esse ego e readquirirmos o aspecto de consciência que só conhece o amor.
Se não a própria doença mental, suas primas chegadas - a cobiça, a autodestruição, a arrogância, a impaciência, a auto-depreciação, a inatividade, a teimosia – são eternos lembretes de nossa própria tarefa de autodomínio. O poder desses lembretes pode ser especialmente intenso devastador quando destrói os relacionamentos afetivos que temos com os outros. Com freqüência sentimos a maior angustia quando começamos a despertar para o nosso Eu superior, pois é então que percebemos o maior contraste entre o que sabemos ser possível e o que nos mostra nossa experiência atual. Lidar com a doença mental e suas primas egotistas pode parecer a tarefa mais difícil no momento.
Como reação ao desespero ocasionado pelo despertar, é comum querer refugiar-se no Eu superior – dissociar-se do mundo terreno de nosso veículo nele, a individualidade objetiva. A pessoa pode buscar uma devoção espiritual que refute a realidade do mundo objetivo e suas muitas frustrações dolorosas. Entretanto, isso não é autodomínio, e não constitui luta vitoriosa contra a doença mental. Ao contrário, a excessiva devoção ao transcendente pode se tornar uma doença mental por si só. Devemos usar as técnicas de meditação não como fuga, mas com a finalidade de expandir o despertar dentro do mundo objetivo.
Com a plena consciência e a relevante participação na realidade objetiva podemos oportunamente dissolver a fonte de desespero e a doença mental, com verdadeira compreensão.
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[Texto de Richard A. Rawson]
28 de mai. de 2010
Lidando com Doenças Mentais
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