29 de ago. de 2010

Por que as Pessoas se Separam?




Pelas razões aparentes mais diversas. Haverá uma causa mais profunda que explique esses desencontros tão comuns e numerosos em nossa vida?

Pais e filhos, marido e mulher, parentes, amigos, colegas, namorados, de desentendem, brigam, se magoam e se afastam, muitas vezes para sempre. Por que será tão difícil manter um relacionamento harmonioso, por que será tão complicado ‘se dar bem com os outros?’

Ressentimentos, discussões amargas _ EGO. Meu Ego me afirma que sou melhor que você, sei mais, tenho mais experiência, tive melhor educação, enfim, sou superior e ‘porque gosto de você [será...?] quero reformá-lo, torná-lo melhor, pelo menos tão bom quanto eu...

As palavras acima podem ser modificadas, suavizadas, enfeitadas, mas o centro da questão [sou melhor que você – quero modificá-lo] continua sendo o grande obstáculo, porque ter um bom relacionamento seja com quem for só é possível através do respeito por sua liberdade de ser como é e de poder decidir como e quando mudar e crescer. Qualquer outro comportamento é falho e leva à discórdia e à frustração – e, em muitos casos, à separação.

Fui testemunha de uma história que se repete constantemente. Uma jovem e um rapaz se apaixonaram e casaram, pois tinham imensa atração e admiração um pelo outro. Tudo indicava que seriam felizes juntos, mas por um motivo que é corriqueiro, embora poucos se dêem conta dele, aconteceu anos mais tarde uma ruptura dolorosa que consternou a todos que os conheciam. O marido dessa jovem, imbuído da certeza de estar fazendo um bem, empreendeu a tarefa de torná-la ‘ainda melhor’ na maneira de se vestir, falar, comportar-se em sociedade, expor idéias, divertir-se, pensar. Em sua santa missão, ele usou de todos os recursos: persuasão, manipulação, culpa, chantagem emocional, ameaças. Seu ‘êxito’ foi completo. Passados alguns anos, sua mulher tinha se modificado, se amoldado ao seu padrão de ‘como deveria ser’. Resultado? O marido não a quis mais. Divórcio, filhos desarvorados, confusão, sofrimento. Tão simples de explicar! Ele havia sido atraído por ela ‘pelo que ela era, como ela era’. Após ‘reformada’, deixou de ser a pessoa que o havia encantado... por ser como era! E o mais curioso foi que ela voltou a ser como antes, espontânea, alegre, e se vestindo com roupas vistosas - e o marido voltou [sem sucesso] a querê-la!!!

O mesmo acontece a toda hora por toda parte; pais querendo reformar filhos, filhos querendo modificar os pais, amigos, colegas, todos querendo ‘ajudar’ os outros a serem melhores segundo seus próprios padrões, mas nenhum deles pensando em sua própria mudança, em seu próprio crescimento. Estranho, mas quem mais pretende ‘reformar’ o outro é quem mais precisa mudar, e só não vê essa verdade porque seu Ego arrogante o convence de que é superior, melhor, mais inteligente, e está com a razão.

Um outro ponto desta questão, tão ou mais importante do que a interferência do Ego na vida de outras pessoas, passa desapercebido, e se refere à razão mais essencial do problema: é tomar consciência de que tudo tem seu ‘ciclo próprio’, mesmo os amores ‘eternos’, as amizades mais sólidas. É difícil, é doloroso perder um amigo, um companheiro ou companheira, um relacionamento que julgávamos ser forte o bastante para desafiar o espaço e o tempo, a vida e a morte... O mais importante nisso tudo é percebermos que ‘não há perda’, só ganhos, quando o nosso sentimento é sincero, quando amamos verdadeiramente e sabemos ‘agradecer’ e compreender as dádivas do amor humano com serenidade e grandeza.

Certa vez ‘perdi’ uma amiga pelo que me pareceu um ato desleal dela, uma traição, digamos assim. Uma grande lição me foi ensinada por esse triste acontecimento, que veio somar-se a muitas das inevitáveis perdas da vida. A decepção foi brutal, a dor profunda, deixando-me abalada, aturdida e ressentida, pois não esperava por aquilo. Senti que aquela era uma ‘perda irremediável’. Passado algum tempo, um vislumbre da verdade me fez ver que eu estava sendo EGO-ísta, negando a ela o direito de ser como era: humana, sujeita a falhas de julgamento, com pleno direito de deixar de me ter afeição quando bm lhe aprouvesse ou fosse chegado o momento. Ela e seus sentimentos não me pertenciam, eram uma dádiva temporária e espontânea; por essa dádiva, pelas alegrias de uma amizade confortadora, pelo apoio mútuo que havia nos amparado em horas difíceis, que havia nos ajudado a atravessar grandes problemas individuais ao longo de muitos anos, pela troca de companheirismo, solidariedade, risos, lágrimas e tantas outras coisas maravilhosas que acontecem entre bons amigos, ‘eu devia me sentir agradecida’. Só isso. O ciclo tinha se encerrado, nada mais. Havíamos cumprido uma missão, ajudando-nos mutuamente a crescer, a evoluir, a superar problemas pessoais que como todo mundo nós tínhamos, a chorar juntas as nossas respectivas mágoas. Nada, nem ninguém, poderia garantir a perenidade, exigir permanência, a Constancia, pois neste plano tudo é transitório, mutável, e segue seu próprio curso. Terminada a volta da espiral, bastou um motivo banal para desencadear a ruptura – pois era chegado o momento. Nossos EGOs [suponho que o dela tanto quanto o meu] se julgaram ofendidos e cheios de razão, porque o EGO não enxerga além de seus próprios limites. Compreender essas coisas em nossos relacionamentos, respeitar o direito do outro de não nos querer mais [é isto que a arrogância de nosso EGO não consegue suportar!] não é nada fácil, mas se alcançarmos essa compreensão teremos escalado um degrau de nossa busca de mais luz e sabedoria – o do desapego verdadeiro, que não é indiferença, é grandeza. Assim abrimos possibilidades para relacionamentos mais generosos e satisfatórios, porque destituídos de nosso lamentável medo de perder...

O ser humano parece valorizar mais o sofrimento que a alegria. Se ‘perdemos’ alguém, lamentamos a dor que isso nos causa, e imediatamente esquecemos o que aconteceu ‘antes’, não sabemos lembrar com prazer aquilo que ‘já recebemos’, os dons inestimáveis que sempre permanecerão conosco, como experiência e lembrança. Esses dons, os momentos de amor e carinho de um casamento, a cumplicidade que existe entre amigos, a vida em família com nossos pais e irmãos, ou o simples namoro que pouco durou mas foi intenso, formam um patrimônio inalienável, eterno e intocável, impossível de ser desfeito, e que foi valioso, enriqueceu e embelezou a vida das pessoas envolvidas, por um ‘ciclo’. Vale lembrar que quando alguém nos deixa para trás, é porque não podia agir de forma diferente, deu na medida em que podia fazê-lo, e então parte para outra experiência, outro ciclo, e tem o sagrado direito, como nós também temos, de partir...

Como pais, somos como o marido reformador da história. Criamos nossos filhos com base na idéia de dominação EGO-ÍSTA da modelagem, do estereótipo. ‘Nós sabemos’ o que é bom para eles, esquecendo de ouvir suas almas, sondar suas inclinações naturais, de sermos apenas os amigos que auxiliam, cooperam, orientam e disciplinam na justa medida. Depois nos queixamos que ‘eles’ não nos compreendem, aqueles ingratos, depois de tudo que fizemos por eles!

Relacionar-se com os filhos não precisa ser complicado. Khalil Gibran disse muito bem que eles não nos pertencem. Seria sábio reconhecer neles, desde cedo, o direito de ser como são. Podemos e devemos orientá-los, estabelecer regras de convivência, afinal esse é o nosso papel, sem, no entanto, ignorar que são criaturas únicas, sem igual em todo o universo, portadoras do sagrado direito de buscas suas próprias respostas seguindo seus próprios ritmos e capacidades. Mas parece que não temos competência para esse tipo elevado de amor... A maioria dos pais segue o caminho oposto, o de forçar os filhos a se encaixarem nos moldes que eles estabelecem como os únicos corretos e que os mutilam indelevelmente – pois não se pode colocar o ‘redondo’ numa forma ‘quadrada’ sem causar danos... como muitos de nós dolorosamente descobrimos após passar por essa experiência. Só que depois repetimos os mesmos erros com os nossos filhos, como eu o fiz, como tu fizeste, como eles o fizeram...

Felizmente, sempre é tempo de tentar mudar o que pode ser mudado. Abrir mão da estúpida idéia de que somos melhores e sabemos mais do que os outros ‘é crescer’: não somos melhores nem sabemos mais – apenas somos diferentes e sabemos das coisas de modos diferentes, o que significa que temos coisas a aprender e a ensinar...enquanto houver mútuo consentimento das partes interessadas. Ninguém pertence a ninguém, estamos aqui de passagem, cada um buscando a luz como sabe e como pode. Amor e amizade são presentes que vida nos dá por algum tempo – minuto ou eternidade, que importa, se sabemos vivenciar a dádiva da plenitude? Já não dizia o poeta ‘que seja eterno enquanto dure’?

Relacionar-se é apenas seguir a mesma estrada com alguém. No inicio, os passos tem a mesma cadencia. Em épocas impossíveis de prever, o passo de um se torna mais rápido, ou o passo do outro se torna mais lento, e então um segue em frente e o outro fica para trás, de acordo com sua natureza. Querer nivelar todos os passos é absolutamente egoísta e insensato: mais cedo ou mais tarde sofreremos as graves conseqüências dessa loucura.

Enfim, a mensagem se resume no seguinte: Neste mundo efêmero tudo é fugaz, passageiro, inconstante. Só o dar/receber é nele um permanente acréscimo. As pessoas que passam por nossa vida e se relacionam conosco são nossos companheiros de jornada – por toda a sua extensão ou por um breve trecho – e são um precioso tesouro. Cada uma delas cumpre uma missão, transmite uma mensagem, ensina uma lição, serve como nosso mestre, e depois segue adiante...A amizade é sempre proveitosa e iluminadora, e renderá dividendos para todo o sempre. Cada um de nós é um canal que manifesta o mesmo fluxo cósmico de amor divino. Cada amigo, cada parente, cada ser com que nos relacionamos é um mensageiro desse amor, quer saiba disso, quer não. Reconhecer isso, e pedir para cada um deles as bênçãos do Cósmico, deixando de lado as mágoas inúteis e nocivas pelo abandono ou por nos terem levado a abandoná-los, é uma chave mágica para o bem viver. Reconhecer em cada um deles um anjo portador de luz – que prova de que estamos crescendo em sabedoria e bondade! É bem verdade que é mais fácil dizer que fazer. Somos presas fáceis da mágoa, da raiva, se os outros não são como achamos que devem ser, ou se não somos como eles acham que devemos ser e por isso ocorre uma separação. Negamos-lhes o mais importante dos direitos – escolha de seus caminhos.

Em conclusão, as separações nesta vida são inevitáveis – nossos entes queridos passam pela transição, vão viver em outro país, preferem outra pessoa, nos deixam por algum motivo, como nós podemos resolver deixá-los. A idéia de que tudo obedece a ciclos, inclusive nossos relacionamentos, é válida e pode nos ajudar sobremaneira a superar os traumas maiores ou menores que essas separações possam nos causar. É tudo uma questão de amar com real desapego.

Fácil?

Não.

Impossível?

Também não.

Merecedor de nosso esforço?

Um milhão de vezes sim!

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[Texto de Ceslawa M.Nycz].