Santayana nasceu em Madrid, em 1863. Foi trazido para a América em 1872 e nela permaneceu até 1912. Tomou grau na Universidade de Harvard e ensinou desde os vinte e sete até aos cinqüenta anos de idade. Um dos seus alunos o descreveu assim:
- Os que o recordam em sua sala de aula hão de lembrar-se de Santayana como um homem solene, suave e recolhido, cujo rosto, como os pintados pelos artistas da Renascença, mostrava um olhar abstrato, um sorriso hierático entre maligno e satisfeito; cuja voz rica defluia com igualdade,em cadencias rítmicas como de liturgia; cujos períodos tinham a intricada perfeição de um poema e o entono de uma profecia; que falava mais por do que para seus ouvintes, e que lhes tocava no fundo de suas naturezas, perturbando-lhes o espírito como faz o oráculo ao qual pertence o mistério e a reverencia – tão rico de distancia e de fascinação era ele, tão imoto e tão criador de movimentos [*Horacio Kellen, no Jornal of Philosophy,1921].
Santayana não se satisfizera com o país de escolha; sua alma, apurada com o muito estudo e sensitiva como sói ser a dos poetas [porque era mais poeta que filosofo], sofria com a barulhenta pressa americana, instintivamente aproximou-se de Boston, como a cidade mais chegada à Europa; e de Boston voltou-se para Cambridge e Harvard, para o convívio de Platão e Aristóteles antes que do de James e Royce. Sorria com amargor à popularidade dos seus colegas e permanecia alheio à multidão e à imprensa; mas sabia que fora sorte ter encontrado um ninho mental na mais bela Escola de Filosofia que uma universidade americana jamais possuiu. “Era uma fresca manhã na vida da razão, nublada, mas luminosa” [*Character and Opinion in the United States, 1921, fim do primeiro capitulo].
Seu primeiro ensaio filosófico, O Senso da Beleza [1896], foi pelo positivo Munsterberg classificado como a melhor produção americana no campo da estética. Cinco anos depois apresentava um volume mais fragmentário e atrativo, Interpretações da Poesia e da Religião. E depois, durante sete anos, como Jacó a servir seus amores, trabalhou em silencio, publicando unicamente ocasionais versos; estava a preparar a sua magnum opus, The Life of Reason. Estes cinco volumes [Reason in Common Sense, Reason in Society e Reason in Science] ergueram-no aos picos de uma fama em que a qualidade supera a quantidade. Estava ali a alma de um grande de Espanha enxertada na estirpe suave de Emerson; uma refinada mistura da aristocracia mediterrânea com o individualismo inglês; e, acima de tudo, uma alma completamente emancipada, quase imune do espírito da época, falando com o acento de um erudito pagão que da antiga Alexandria viesse visualizar com olho agudo os nossos sistemazinhos e analisar nossos sonhos renascidos, com o mais calmo raciocínio e na mais perfeita prosa. Dificilmente, desde Platão, a filosofia se exprimiu melhor; as palavras em seus escritos adquiriram novo travo; as frases, uma delicada textura, perfumadas com sutileza e finamente apuradas dos espinhos da sátira; o poeta falava nessas luxuriantes metáforas e o artista, nos parágrafos cinzelados. Era um encanto encontrar um homem que sentisse assim o fascínio da beleza e o apelo da verdade.
Depois deste esforço Santayana descansou na sua fama, contentando-se com produzir poemas e pequenos ensaios [*Three Philosophycal Poets [1910] – preleções clássicas sobre Lucrecio, Dante e Goethe; Winds of Doctrine [1913]; Egostism in German Philosophy [1916]; Character and Opinion in the United States [1921]; e Solliloquies in England [1922]. Todos estes estudos são dignos de leitura e mais acessíveis que a Life of Reason, Little Essays from the Writings of George Santayana, pelo próprio Santayana, formam uma admirável seleção]. E então – estranho dizê-lo! Após abandonar a universidade de Harvard e mudar-se para a Inglaterra, e quando todos julgavam sua obra finda, publicou em 1923 um substancioso volume, Scepticism and Animal Faith, com a alegre declaração de tratar-se apenas do introdutório de um novo sistema de filosofia, a ser denominado “Realms of Being”. Era estranho ver um homem de sessenta anos metido em viagens longas e produzindo um livro tão vigoroso no pensamento quão belo na forma. Vamos começar com esta ultima produção, que constitui a porta de entrada para o pensamento de Santayana.