13 de dez. de 2011

Um Texto Iluminado

No vigésimo terceiro ano do reinado de  Zhao, Lao Tsu percebeu que a guerra terminaria destruindo o lugar onde vivia. Como havia passado anos meditando sobre a essência da vida, sabia que em certos momentos é preciso ser prático. Resolveu, pois, tomar a decisão mais simples: mudar-se.

Pegou seus poucos pertences e seguiu em direção a Han Keou. Na porta de saída  da cidade, encontrou um guarda.

- Onde está indo tão importante sábio? – perguntou o guarda.

- Para longe da guerra.

- Não pode partir assim. Eu gostaria muito de saber o que foi que aprendeu em tantos anos de meditação. Só o deixarei sair se dividir comigo o que sabe.

Apenas para livrar-se do guarda, Lao Tsu escreveu ali mesmo um pequeno livrinho, cuja única cópia lhe entregou. Depois, continuou sua viagem, e nunca mais se ouviu falar dele.

O texto de Lao Tsu foi copiado e recopiado, atravessou séculos, atravessou milênios, e chegou até o nosso tempo. Chama-se TÃO TE KING, está publicado em português por várias editoras e é uma leitura imperdível. Aqui vai uma de suas páginas:

Aquele que conhece os outros é sábio.
Aquele que conhece a si mesmo é iluminado.
Aquele que vence os outros é forte.
Aquele que vence a si mesmo é poderoso.
Aquele que conhece a alegria é rico.
Aquele que conserva seu caminho tem vontade.

Seja humilde, e permanecerás integro.
Curva-te, e permanecerás ereto.
Esvazia-te, e permanecerás pleno.
Gasta-te, e permanecerás novo.

O sábio não se exibe, e por isso brilha.
Ele não se faz notar, e por isso é notado.
E, porque não está competindo, ninguém no mundo pode competir com ele.

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Contos do Alquimista_ Paulo Coelho.

O que o Sábio pedia a Deus

Um homem recebeu, certa vez, a visita de alguns amigos.

- Gostaríamos muito que nos ensinasse aquilo que você aprendeu em todos estes anos – disse um deles.

- Estou velho, respondeu o homem.

- Velho e sábio – disse outro. 

– Afinal de contas, sempre te vimos rezando durante todo este tempo. O que conversa com Deus? Quais são as coisas importantes que devemos pedir?

O homem sorriu.

- No começo, eu tinha o fervor da juventude, que acredita no impossível! Então, eu me ajoelhava diante de Deus e pedia para que me desse forças para mudar a humanidade.

“Aos poucos, vi que era uma tarefa além das minhas forças. Então, comecei a pedir a Deus que me ajudasse a mudar o que estava à minha volta.”

- Neste caso, podemos garantir que parte de seu desejo foi atendido – disse um dos amigos. – Seu exemplo serviu para ajudar muita gente.

- Ajudei muita gente com meu exemplo; mesmo assim, sabia que não era a oração perfeita. Só agora, no final de minha vida, é que entendi o pedido que devia ter feito desde o inicio.

- E qual é este pedido?

- Que eu fosse capaz de mudar a mim mesmo.

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Contos do Alquimista_ Paulo Coelho.    

Como Temperar o Aço

Lynell Waterman conta a história do ferreiro que, depois de uma juventude cheia de excessos, decidiu entregar sua alma a Deus.
Durante muitos anos trabalhou com afinco, praticou a caridade, mas, apesar de toda a sua dedicação, nada parecia dar certo em sua vida.

Muito pelo contrário: seus problemas e dívidas acumulavam-se cada vez mais.

Uma bela tarde, um amigo que o visitava e que se compadecia de sua situação difícil, comentou:
- É realmente muito estranho que, justamente depois que você resolveu se tornar um homem temente a Deus, sua vida começou a piorar. Eu não desejo enfraquecer sua fé, mas, apesar de toda sua crença no mundo espiritual, nada tem melhorado.

O ferreiro não respondeu imediatamente. Ele já havia pensado nisso muitas vezes, sem entender o que acontecia em sua vida.

Entretanto, como não queria deixar o amigo sem resposta, começou a falar -  e terminou encontrando a explicação que procurava. Eis o que disse o ferreiro:

- Eu recebo nesta oficina o aço ainda não trabalhado e preciso transformá-lo em espadas. Você sabe como isso é feito?

“Primeiro eu aqueço a chapa de aço num calor infernal, até que ela fique vermelha. Em seguida, sem qualquer piedade, eu pego o martelo mais pesado, e aplico vários golpes, até que a peça adquira a forma desejada.

Logo, ela é mergulhada num balde de água fria e a oficina inteira se enche como barulho do vapor, enquanto a peça estala e grita por causa da súbita mudança de temperatura.

Tenho que repetir este processo até conseguir a espada perfeita -  uma vez apenas não é suficiente.”

O ferreiro deu uma longa pausa, acendeu um cigarro, e continuou:

- Ás vezes, o aço que chega às minhas mãos não consegue agüentar o tratamento. O calor, as marteladas e a água fria terminam por enchê-lo de rachaduras. E eu sei que jamais se transformará numa boa lâmina de espada.

“Então, eu simplesmente o coloco no monte de ferro velho que você viu na entrada da minha ferraria.”

Mais uma pausa, e o ferreiro concluiu:

- Sei que Deus está me colocando no fogo das aflições. Tenho aceitado as marteladas que a vida me dá e, às vezes, sinto-me tão frio e insensível como a água que faz sofrer o aço. Mas a única coisa que eu peço é: “Meu Deus, não desista até que eu consiga tomar a forma que o Senhor espera de mim. Tente da maneira que achar melhor, pelo tempo que quiser, mas jamais me coloque no monte de ferro velho das almas.”

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Contos do Alquimista_ Paulo Coelho.   

O Desejo Deve Ser Forte

O Yoga Ramakrishna ilustra, com uma parábola, a intensidade do desejo que precisamos ter:

  • O mestre levou o discípulo para perto de um lago.
- Hoje vou ensiná-lo o que significa a verdadeira devoção – disse.
Pediu ao discípulo que entrasse com ele no lago e, segurando a cabeça do rapaz, colocou-a debaixo d’água.
O primeiro minuto passou. No meio do segundo minuto, o rapaz já se debatia com todas as forças para livrar-se da mão do mestre e poder voltar à superfície.
No final do segundo minuto, o mestre soltou-o. O rapaz, com o coração disparado, levantou-se ofegante.
- O senhor quer me matar! – gritava.
O mestre esperou que ele se acalmasse e disse:
- Não desejei matá-lo porque, se desejasse, você não estaria mais aqui. Queria apenas saber o que sentiu enquanto estava debaixo d’água.
- Eu me senti morrendo! Tudo que desejava na vida era respirar um pouco de ar!
- É exatamente isso. A verdadeira devoção só aparece quando só temos um desejo, e morreremos se não conseguirmos realizá-lo.


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Contos do Alquimista_ Paulo Coelho.

O Jogral de Nossa Senhora

Conta uma lenda medieval que, com o Menino Jesus nos braços, Nossa Senhora resolveu descer à Terra e visitar um mosteiro.

Orgulhosos, todos os padres fizeram uma grande fila, e cada um postava-se diante da Virgem, procurando homenagear a mãe e o filho. Um declamou poemas, outro mostrou suas iluminuras para a bíblia, um terceiro disse o nome de todos os santos. E assim por diante, monge após monge mostrou seu talento e sua dedicação aos dois.

No último lugar da fila havia um padre, o mais humilde do convento, que nunca havia aprendido os sábios textos da época. Seus pais eram pessoas simples, que trabalhavam num velho circo das redondezas, e tudo que lhe haviam ensinado era atirar bolas pra cima e fazer alguns malabarismos.

Quando chegou sua vez, os outros padres quiseram encerrar as homenagens, porque o antigo malabarista não tinha nada de importante para dizer, e podia desmoralizar a imagem do convento. Entretanto, no fundo do seu coração, também ele sentia uma imensa necessidade de dar alguma coisa de si para Jesus e a Virgem.

Envergonhado, sentindo o olhar reprovador dos seus irmãos, ele tirou algumas laranjas do bolso e começou a jogá-las para cima, fazendo malabarismos – que era a única coisa que sabia fazer.

Foi só neste instante que o Menino Jesus sorriu, e começou a bater  palmas no colo de Nossa Senhora. E foi para ele que a Virgem estendeu os braços, deixando que segurasse um pouco a criança.

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Contos do Alquimista_Paulo Coelho.