12 de abr. de 2010

Experiências Extrafísicas


O título deste artigo pode ser surpreendente para muitos leitores, mas as circunstancias o justificam. Hoje em dia lemos muito na mídia sobre experiências ‘fora do corpo’ ou de ‘quase morte’ e percebemos que esse tipo de expressão é erroneamente usado para descrever aquilo que normalmente conhecemos como ‘projeção da consciência’. A real diferença entre os dois tipos de fenômenos, então, fica indistinta ou confusa. O que eu fiz foi tomar uma característica comum a ambas as experiências e usá-la para identificá-las conjuntamente. Ou seja, em ambos os casos a consciência parece estar situada fora do corpo físico.

A diferença básica entre eles está em que a projeção da consciência é um fenômeno volitivo que ocorre com o individuo num estado mental consciente, ao passo que experiências ‘fora do corpo’ ou de ‘quase morte’ acontecem como fenômenos involuntários com o indivíduo em estado inconsciente – em decorrência de uma pancada na cabeça ou de anestesia.

UMA EXPERIÊNCIA ‘FORA DO CORPO’
Quando uma pessoa fica inconsciente, parece que a mente inconsciente ou subjetiva continua a monitorar as situações que se aplicam ao corpo adormecido. Se durante esse período surgirem condições que ameacem o bem-estar do corpo, a mente subjetiva poderá tentar advertir a mente antes consciente do perigo iminente, a fim de que ela possa exercer o poder consciente da vontade para a ação física apropriada. Quando isso ocorre é que a pessoa tem a memória de uma experiência ‘fora do corpo’.

Um caso típico freqüentemente citado a esse respeito é o de um piloto da Segunda Grande Guerra cujo avião foi atingido e entrou em mergulho sem controle enquanto o próprio piloto permanecia inconsciente. Num dado momento ele pareceu ver, como se do ponto de vista de um observador externo, o avião com ele próprio na nacela, debruçado sobre os controles. Nesse estado ele percebeu que teria de puxar o manche para trás a fim de evitar que o avião se chocasse contra o solo. Não teve mais consciência de coisa alguma mas depois recobrou a consciência e viu que o avião voava reto e nivelado.

Minha única experiência pessoal desse gênero ocorreu quando eu, ainda rapazinho, estava procurando ninhos de passarinhos e caí de uma árvore, fraturando o braço. Passados três dias de agonia, após me terem dito que era apenas um entorse, fui ao Hospital Cottage, uma instituição publica local que praticava medicina em condições muito primitivas.

Os dois médicos do hospital, que nem sequer usavam a clássica bata branca, levaram-me para uma pequena sala de cirurgia, equipada com um velho aparelho de raios X e uma maca almofadada. Fizeram-me deitar na maca, cobriram meu rosto com um pano e derramaram clorofórmio nele. Minha última experiência consciente foi ver o teto da sala, iluminado pela luz solar, ir ficando cada vez menor, enquanto eu caía numa espécie de poço muito fundo e escuro. De repente houve uma mudança de cena naquela escuridão e eu me vi suspenso perto do teto da enfermaria contígua. Eu olhava para baixo e via os dois médicos, que carregavam eu corpo inconsciente simplesmente agarrando-me por baixo dos joelhos e dos sovacos. Meus braços estavam cruzados sobre o peito.

Horrorizado, notei que meu braço esquerdo, sob o peso do gesso que o envolvia, ameaçava escorregar do peito e tombar em agonia na direção do solo. Em vista de minha agonia dos três dias anteriores, isso era inadmissível. Além disso, só eu podia evitar o problema, segurando meu braço esquerdo com a mão direita. Precipitei-me para baixo, gritando ao mesmo tempo, “Podem deixar! Eu pego!”, para os dois médicos; então fiquei inconsciente outra vez, mal as palavras saíram de meus lábios.

Voltei a mim com a lembrança daquela experiência extraordinária bem forte na minha mente. Olhei à minha volta e vi o ambiente que já observara das proximidades do teto da enfermaria. Nesse momento uma enfermeira - interpretando minha preocupação como sinal de um desastre iminente – aproximou-se, apontou para uma “comadre” e mandou que eu me acomodasse rapidamente nela!

UM CONTO DE INVERNO
Lembro-me bem das dificuldades que tive durante minhas primeiras tentativas de projetar minha consciência. A força que eu fazia ameaçava arranca os olhos de suas órbitas!Estava longe de uma técnica descontraída!

O Buscador as vezes esbarra com certas leis que parecem não ter sido mencionadas durante seus estudos. Uma dessas leis estabelece aparentemente que, se você quer alcançar certo resultado, precisa antes pagar pelo privilégio. George Gurdjieff menciona isso a propósito de sua compra de um lvro numa livraria. O livreiro cobrou o livro e mais ‘porte e embalagem’, e Gurdjieff pagou sem reclamar. Quando saiu da loja, seu companheiro protestou, dizendo que Gurdjieff tinha sido ludibriado. Gurdjeff replicou que sua avó sempre dizia, “a gente tem que estar preparada, para pagas as despesas e o porte em qualquer negócio”! A moral disso indica a necessidade de estarmos preparados para fazer um esforço ‘além’ do que é normalmente esperado de nós.

Lembro-me de que, numa noite de domingo, parece que eu estava com a impressão de que, se deixasse de fumar durante cinco dias, conseguiria êxito em minhas tentativas de projeção da consciência. Devo dizer de começo que estava disposto a ler algumas monografias – e até fazer mais alguns exercícios, mas isso era pedir demais! A verdade é que eu estava lutando para me qualificar para o ‘Victoria Cross’ – que, no meu caso, seria provavelmente um prêmio póstumo!

Há ocasiões [espero que bastante esporádicas] em que sou acusado de ser teimoso, antipático, e de agir de modo inadequado. Felizmente para mim, naquela oportunidade essas preciosas qualidades me ajudaram. Creio ter dito a mim mesmo, “Muito bem! Vou fazer isso. Mesmo porque, se não fizer, será melhor parar de uma vez com essa coisa de misticismo! E, se no final o Cósmico fugir do acordo, então saberemos quem é o melhor!”

Você pode estar impaciente, meu caro leitor, mas eu vou continuar. Durante a semana seguinte, minha tendência a recuar quase me convenceu a desistir. Tinha gente que me dizia: “Está tudo na sua mente, seu bobo”, e “como se você pudesse fazer um pacto com o Cósmico”! Felizmente minha teimosia venceu e eu cheguei à noite de sexta-feira doido para fumar um cigarro mas decidido a fazer os exercícios preparatórios para a projeção. Isto aconteceu em fevereiro, numa típica noite escura de inverno. Menciono isto porque pode ter tido algum papel no que então ocorreu. A obscuridade da minha ‘visão interior’ diminuiu um pouco e eu me vi de pé no jardim de um chalé à margem de um grande bosque. Estava bem escuro e eu mal conseguia perceber os galhos das árvores sem folhas contra o céu quase negro. O mais espantoso, porém, era a geada muito branca que cobria quase tudo. Cada cristal de gelo brilhava com um fogo interior, como se a paisagem estivesse coberta de diamantes. Raciocinei que eles deviam estar sendo iluminados por alguma fonte de luz atrás de mim. Voltei-me para verificar. Neste ponto devo lhe perguntar, caro leitor, se você já tentou voltar-se para trás sem usar as pernas. Não dá para fazer isso! Teimoso como sempre, em vão o tentei e acabei voltando à consciência comum em minha casa, sentado na minha cadeira. Ah, como ‘curti’ aquele primeiro cigarro!

MAGIA NA ILHA DE CORAL
Na noite seguinte, farto do inverno, novamente projetei minha consciência, mantendo em mente a imagem de uma palmeira. E veja só! Vi-me de pé próximo a uma plantação de coqueiros - e eu tinha visualizado palmeiras de ‘tâmaras’ na praia de coral de alguma ilha do Pacifico! Olhando para o mar, notei então uma nuvem escura que se aproximava. Senti que aquele aguaceiro tropical logo estaria desabando e fiquei observando atentamente seu progresso. Rapidamente ele envolveu a linha costeira num verdadeiro pé d’água e eu automaticamente levei a mão à testa para proteger os olhos da chuva! Quando fiz isto, quase caí na risada, pensando, ‘seu tolo, você não tem olhos’! E constatei que isso era verdade quando ergui os olhos para a chuva notei que podia enxergar sem problema nenhum. Mas a situação foi tão engraçada que eu me vi de volta na minha cadeira, em casa, morrendo de rir!

UMA PESSOA REALMENTE VIVA
A essa altura eu tomara consciência do fato de que, em minhas projeções, não aparecera nenhuma alma viva. Estaria eu explorando algum ambiente simulado, produto de minha própria fantasia?

Firmei na mente a imagem de uma ou outra pessoa e me vi dessa vez à margem do que parecia ser uma típica estrada secundária na região de Mistletoe Bough. Já tinha então descoberto que, naquelas condições qualquer tipo de movimento se consegue simplesmente pelo pensamento, sem necessidade de pernas ou de qualquer outra coisa. “Caminhei” para o meio da estrada e notei que ela serpenteava pelo alto de um morro e fazia uma curva para a esquerda em torno de um olmo solitário. Observando pacientemente, flagrei uma cabeça que aparecia por cima de uma cerca viva de pilriteiro, como que dirigindo-se para onde eu estava.

O homem dobrou a curva da estrada e notei que ele estava correndo. Provavelmente um precursor dos apressados de hoje em dia. Decidido a ver seu rosto eu fiquei estupidamente no meio da estrada, bem no seu caminho! De repente ele estava ‘em cima’ de mim. Senti então um choque súbito e imediatamente saí da projeção. Projeção da consciência ou não, a ação do seu corpo passando através de mim é um fato que eu não gostaria de repetir. Para meu consolo, no entanto, passei alguns minutos pensando se aquele homem não teria sofrido um choque semelhante e se ele não teria voltado para casa com a história de ter visto um ‘fantasma’ em plena luz do dia.

QUEIMANDO NA FOGUEIRA
Com essa experiência em mente, minha viagem seguinte ao desconhecido começou com a visualização do signo de uma cruz. Se bem me lembro, foi a imagem de uma cruz grega.

Tomei então consciência de uma neblina escura que soprava da minha esquerda para a minha direita. Na verdade, de oeste para leste. Sempre tive um bom senso de direção. A principio achei que se tratava de um siroco ou uma tempestade de areia e me aproximei para observar o solo. Notei que ele estava coberto de pedregulhos e veio à minha mente a frase: “Até as pedras haverão de chorar”! Nesse ponto percebi que se tratava de pessoas ajoelhadas, rezando. Todas usavam uma veste azul com capuz. Olhando mais de perto, pude notar que as vestes estavam aparentemente forradas com um tecido verde e imediatamente reconheci a situação. Era a ocasião do abominável Massacre de Montségur, quando centenas de sacerdotes cátaros foram queimados na fogueira. Mas havia algo mais.

Os historiadores parecem concordar em que os sacerdotes cátaros usavam vestes azuis e verdes. Isto sugere que eles tinham uma veste azul para rituais privativos em sua igreja uma veste verde para viajarem de modo a se camuflarem na paisagem do campo. O problema, naquela ocasião, estava na expressão ‘vestes azuis e verdes’, que eu devia ter entendido como vestes ‘azuis-e-verdes’! Ou seja, vestes reversíveis!

UM SINGULAR INSTRUMENTO DE PESQUISA
Suponho que a maioria de nós, aos primeiros contatos com princípios de projeção da consciência, tende a encarar o fenômeno como uma espécie metafísica de ‘vídeo game’, ou até como um meio de espionar o próximo.

Devo confessar que, na ocasião, eu também o encarei assim. Mas a experiência com o Massacre d Montségur mudou tudo. Para começar eu acabara de descobrir uma evidência histórica pela qual muitos acadêmicos dariam a vida. E isto não era de se desprezar.

Devo talvez explicar que, meio por acidente, certamente não por deliberação, meu principal interesse mais ou menos nos últimos 25 anos tem sido um tipo especial de pesquisa. Na realidade, a pesquisa de ‘técnicas de pesquisa’. Isto não é apenas um astucioso jogo de palavras e sim uma forma especial de pesquisa. Acontece que, quando nos decidimos a fazer alguma coisa em particular, como preparar uma refeição ou cuidar de um jardim, primeiro procuramos dispor do equipamento e das ferramentas necessárias; fogão e panelas ou pá e ancinho. Segue-se que, se pretendemos nos empenhar em algum tipo de pesquisa, precisamos nos armar com ferramentas adequadas para isso, isto é, técnicas de pesquisa. Um enfoque que eu acho que é quase desconhecido no campo da cultura.

Seja como for, tive a felicidade de desenvolver, com o passar dos anos, três técnicas relativas a pesquisa original. A primeira, uma técnica de pensamento que eu chamo de ‘lógica recursiva’, é uma redescoberta do Novum Organum de Francis Bacon – seu ” Novo Método de Lógica”. Embora se possa demonstrar que ela era comumente usada há milhares de anos. A terceira é uma técnica de controle que não nos interessa aqui. A segunda, porem, eu chamo de ‘técnica de percepção’ e entre as ferramentas de que ela se utiliza destaca-se a ‘projeção da consciência’.

O que começou com um exercício místico, esotérico, mostrou ser um inestimável instrumento de pesquisa cientifica.
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[Texto de Divinator]

Sonhador da Montanha Oriah


Não me interessa ... o que você faz para ganhar a vida.

Quero saber o que você deseja ardentemente, se ousa sonhar em atender aquilo pelo qual seu coração anseia.

Não me interessa saber a sua idade.

Quero saber se você se arriscará a parecer um tolo por amor, por sonhos, pela aventura de estar vivo.

Não me interessa saber que planetas estão em quadratura com a sua lua.

Quero saber se tocou o âmago de sua dor, se as traições da vida o abriram ou se você se tornou murcho e fechado por medo de mais dor!

Quero saber se pode suportar a dor, minha ou sua, sem procurar escondê-la, reprimi-la ou narcotizá-la. Quero saber se você pode aceitar alegria, minha ou sua; se pode dançar com abandono e deixar que o êxtase o domine até a ponta dos dedos das mãos ou dos pés, sem nos dizer para termos cautela, sermos realistas, ou nos lembrarmos das limitações de sermos humanos.

Não me interessa se a história que me conta é a verdade.

Quero saber se consegue desapontar outra pessoa para ser autêntico consigo mesmo, se pode suportar a acusação de traição e não trair a sua alma. Quero saber se você pode ver beleza mesmo que ela não seja tão bonita todos os dias, e se pode buscar a origem de sua vida na presença de Deus. Quero saber se você pode viver com o fracasso, seu e meu, e ainda, à margem de um lago, gritar para a lua prateada: ‘Posso!’

Não me interessa onde você mora ou quanto dinheiro tem.

Quero saber se pode levantar-se após uma noite de sofrimento e desespero, cansado, ferido até os ossos, e fazer o que tem de ser feito pelos filhos.

Não me interessa saber quem você é e como veio parar até aqui.

Quero saber se você ficará comigo no centro do incêndio e não se acovardará.

Não me interessa saber onde, o quê, ou com quem você estudou.

Quero saber o que o sustenta a partir de dentro, quando tudo o mais desmorona.

Quero saber se consegue ficar sozinho consigo mesmo e se, realmente, gosta da companhia que tem nos momentos vazios.
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[Texto do Ancião Índio Americano]

Frankenstein, o Moderno Prometeu


“Penso, logo existo” R.Descartes

No chuvoso verão de 1816, o poeta Shelley e sua esposa Mary Shelley passaram as férias na mansão de Isaac Newton, na Suíça, onde se reuniam com freqüência na casa do também poeta Lord Byron.

A época era a da Revolução Industrial e do crescente avanço do saber cientifico e racional. Na Arte, porém, o espírito rebelde romântico enaltecia a subjetividade e o sentimentalismo, pregando a liberdade criadora inata do homem, o que se chocava com os princípios de um capitalismo e um progresso que levavam à miséria e ao trabalho forçado nas fábricas.

Lord Byron se interessava pelas descobertas de Volta e Galvano sobre a eletricidade. Na época, vigorava o princípio da ‘abiogênese’, que dizia ser possível criar vida a partir de matéria não-viva. Shelley especulou se era possível dar vida a um cadáver pela eletricidade.

Numa noite em que estavam reunidos, Byron lançou um desafio aos presentes – Shelley, Mary e um médico conhecido, Polidoro – de fazerem um romance macabro, bem ao gosto dos românticos.

Mary Shelley não conseguiu dormir bem, ficando a noite inteira no limiar entre o sono e a vigília. E no dia seguinte anunciou que criara uma história. A história de um cientista que dá vida a um corpo formado a partir de pedaços de cadáveres é mais que uma fantasia romântica. Algum tempo depois, Mary Shelley escreveu o romance “Frankenstein, o Moderno Prometeu”, em que a figura perturbada do cientista Frankenstein tem que dialogar com sua obra, que é um ser consciente e humano [aqui não se lembre da versão do cinema] e que procura desesperadamente o sentido da criação buscando seus próprio criador, o doutor Frankenstein.

O título do romance, “Moderno Prometeu”, explica-se nesse contexto de discussão sobre o ‘poder criador do homem’. Assim como nós observamos o universo e a nossa própria natureza tentando descobrir o nosso Criador, também o ser criado por Frankenstein interroga-se continuamente, procurando o sentido de sua existência.

Mary Shelley foi fortemente influenciada pelo Mito de Prometeu, pois seu marido estava traduzindo os originais gregos para o inglês naquele verão. Para os românticos, Prometeu é o símbolo da genialidade criadora lutando contra convenções sociais; em Goethe, Prometeu é o próprio homem lutando para se libertar da escravidão de deuses titânicos. Para o historiador Jean-Pierre Vernant, Prometeu tem ligações com o conhecimento técnico. É um deus artesão que rouba de Zeus o conhecimento de fazer o fogo, mas tem que trabalhar para mantê-lo. Uma analogia clara com o mito de Adão que, ao descobrir o fruto do conhecimento, deve suar e enfrentar os cardos e espinhos para poder tirar o pão que o sustenta.

O mito de Prometeu representa a emancipação humana pelo conhecimento racional, mas além disso a árdua tarefa de conquistá-la lentamente. É esta a vida de Prometeu – ter seu fígado comido durante o dia enquanto pensa, mas ao cair da noite sua mente não-racional e onírica recompõe seus pedaços esfacelados. O saber cientifico atual pode libertar, mas ao mesmo tempo causar dependência. Em Frankenstein, o Moderno Prometeu antecipa inquietantemente a bomba atômica, criação que destrói o próprio homem. O mito reconstrói-se em cada momento importante na história das mentalidades humanas. Para Tertuliano, no princípio da Igreja Cristã, Prometeu é Cristo que ama a humanidade e morre por ela; no Renascimento ele é o saber que luta contra essa mesma Igreja, que ameaça com a fogueira os hereges. Sua reconstrução, sob a forma de Frankenstein, pela esposa de um grande poeta, que nunca pensara em ser literata, mostra a vontade criadora e a rebeldia individual no Romantismo.

Na versão do cinema – a primeira, pela Universal, em preto e branco – numa eloqüente e bela interpretação, Boris Karloff é um monstro assassino porque seu cérebro é o de um criminoso. Claro reflexo da “teoria cientifica de que é o cérebro a sede de nosso caráter.”

Ainda virão outros tempos e novas visões enriquecerão ainda mais o antigo Prometeu.

A reflexão que deveríamos fazer acerca do mito é sobre o uso que fazemos de nosso conhecimento. Francis Bacon nos interroga sobre o uso de nosso aprendizado. Tal como o doutor Frankenstein, muitas vezes podemos criar algo para nos arrepender depois. Em nossa era atômica, é impressionante a prova de que avanço tecnológico e cientifico por si só não irá trazer felicidade, necessitando de uma contra-parte espiritual. Através da experiência onírica, reconstruímos nosso pensar a cada noite, mas talvez possamos também alcançar um mundo de experiências espirituais superiores e, assim, unindo o racional ao intuitivo, passar da análise à síntese e, por fim, num claro exemplo da vontade e do esforço prometéico, libertar nosso Prometeu.
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[Texto de Henrique Cavalcanti de Albuquerque]