Grande parcela da humanidade geralmente considera o intelecto, a mente racional, o mais elevado nível de consciência possível ao homem, e que os problemas da vida podem ser solucionados unicamente por meio dele. O místico discorda deste ponto de vista, ciente de que há níveis de consciência muito superiores ao intelecto, que é limitado em sua função.
O modo místico de solucionar os problemas da vida consiste primeiro em empregar a mente racional até o limite de sua capacidade, e, em seguida, transferir o assunto para o Eu interior, permitindo que os níveis mais elevados de consciência forneçam uma solução. O emprego exclusivo do intelecto faz lembrar alguém que dirigisse um carro em primeira, sem se dar conta de que há outras marchas para serem utilizadas.
Para se compreender a visão mística da vida é primeiramente necessário definir o ser humano do ponto de vista místico. O homem é um ser físico e espiritual. O misticismo sustenta que o Eu interior, a verdadeira essência do homem, é uma entidade divina – imortal, ilimitada, impoluta, sagrada. O organismo humano é um veiculo físico através do qual o Eu interior pode manifestar-se no mundo material. O Eu interior é o Ser real do homem, integrando o aspecto divino da existência humana. Os aspectos físico e espiritual constituem duas realidades diferentes operando em harmoniosa correspondência.
Na vida cotidiana – tomando decisões, relacionando-se com outras, cuidando de si mesma, etc - toda pessoa revela sua personalidade individual. Em nenhum individuo, porém, a personalidade é imagem perfeita da alma, porque se manifesta através dos componentes exteriores do organismo e da consciência objetiva. A tarefa do Eu interior é levar a consciência objetiva a uma condição em que possa reconhecer-se como expressão e reflexo do Ser interior – em que possa reconhecer o Eu interior*, e buscar mesmo sua orientação para todos os aspectos de sua vida no mundo exterior.
A voz do Eu interior – essa voz intima – pode ser muito forte, mas pode também ser muito sutil. Inúmeros indivíduos tem dificuldade em reconhecer a voz sutil do eu interior. Após anos vividos apenas no mundo exterior, no mundo material, descrêem da existência dessa voz em si mesmos, e, por conseguinte, ficam privados de sua valiosa orientação e sabedoria.
PERSONALIDADE
A personalidade de um individuo forma-se através de muitos anos de desenvolvimento. É moldada por experiências do mundo exterior e influenciada pelo modo como tais experiências são incorporadas e compreendidas pelo individuo. Porém, de modo ainda mais relevante, a personalidade é moldada pelas lições marcantes que o individuo aprenda durante a sua vida. Tais lições nascem de refletirmos sobre nossas experiências, e de nos harmonizarmos com o Eu interior em busca de orientação e maior compreensão. Naturalmente, cada um de nós traz para esta encarnação o inestimável conhecimento acumulado em milhares de experiências do passado. Este conhecimento exerce indiscutível influencia em nosso atual período de vida particularmente quando nos harmonizamos como Eu interior. Vivemos muitas experiências em encarnações passadas, que poderão nos valer na vida presente, se aprendermos a nos harmonizarmos com o Eu interior para receber orientação.
O momento presente, e apenas o momento presente, é realmente vivido. Esta centelha de consciência, ‘o agora’, percorre o ‘tempo’ qual ponto de luz traçando um rastro luminoso na escuridão. Este ‘agora’ que tudo abrange é a manifestação da personalidade anímica na matéria – a consciência humana.
A consciência humana criou, por conta própria, uma ilusão popularmente chamada ‘ego’. Os psicólogos definem o ‘ego’ como ‘a parte consciente da personalidade’. É o aspecto da personalidade que se ocupa do mundo material. Poderíamos chamá-lo de Eu exterior. Nestes termos, o ego, ou Eu exterior, é o traço luminoso desse instante de consciência a que chamamos presente – o agora.
A consciência humana acredita de modo irrestrito que o ego por ela criado seja real. Na verdade, porém, é ele a reminiscência daquilo que já existiu. Não tem existência real independente da que lhe atribui a mente racional, por nele crer. O ego domina a personalidade porque a consciência está para ele voltada. Se, ao contrário, a consciência estivesse mais voltada para o Eu interior, o domínio do ego na personalidade de certo modo cessaria. Na prática, essa propensão da consciência para o Eu interior, essa confiança na sua orientação, é parcial. A libertação do domínio do ego ocorre na proporção direta do grau em que a propensão da consciência é reorientada.
Para aclarar estas noções, examinemos os conceitos que muitas pessoas fazem acerca de si mesmas e de outras. Excluindo-se as características físicas, uma pessoa é reconhecida por suas qualidades. Conseqüentemente, pode-se dizer que uma pessoa é gentil ou grosseira, honesta ou desonesta, feliz ou infeliz, etc. Isto constituiria o que se acha que a pessoa é. Porém, boa parcela das idéias que fazemos das pessoas depende de aspectos superficiais da sua personalidade. Na realidade, como é a pessoa interiormente? Até que ponto nossa opinião acerca de um individuo é falseada por nossas próprias emoções e carências – por nosso Eu exterior? Até que ponto se alicerça na experiência passada? [Tenhamos em mente que todos mudamos interiormente à medida que o tempo passa e vivemos novas experiências]. Por esta mesma razão, freqüentemente a imagem que fazemos de nós próprios também não e fiel. Poder-se-ia dizer que até certo ponto é uma ilusão que criamos para explicar nosso ser a nós mesmos. As maquinações do intelecto são proveitosas apenas quando refletem a realidade que somos, e não o ego, que não somos.
Como antes afirmamos, o Eu interior tem sobre si a tarefa bastante difícil de criar condições para que o Eu exterior venha a reconhecer a presença do divino Ser interior, e ativamente buscar sua orientação. Naturalmente, o processo é complicado pelas influencias do organismo físico e do mundo material em que vivemos, que nos predispõem a considerar real o mundo exterior. Mesmo quando um individuo toma a decisão consciente de seguir os ditames do Eu interior, sobrevém um longo período em que tal decisão é testada por eventos do mundo exterior.
Porém, o individuo deve persistir desenvolvendo o vinculo com o Eu interior, confiando em sua orientação. Em muitos sentidos, é este um processo de esclarecimento, pois, à medida que mais prontamente ouvimos a voz interior, tornamo-nos capazes de melhor perceber e compreender. Nosso desenvolvimento se acelera, e nos tornamos capazes de realizar transformações mais positivas e construtivas em nossa personalidade exterior.
Uma vez que a ilusão do ego seja substituída pela realidade do Eu interior, o intelecto torna-se aquilo para que foi destinado – um maravilhoso instrumento da mente, utilizado sob a orientação da personalidade anímica, de modo que espiritualidade e verdade manifestem-se em todos os seus níveis de expressão.
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[Texto de Fred Flanagan]
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