Existem dois tipos de motivação pelos quais o homem é obrigado a agir na vida. A um podemos dar o nome de compulsão e ao outro, autogerado. Esta compulsão para agir tem natureza dupla. Primeiro, há os instintos, tais como o impulso inato para a sobrevivência, a satisfação dos apetites e a curiosidade instigadora. Estas compulsões surgem involuntariamente dentro de nós; não as evocamos.
O segundo aspecto da compulsão são as influências ambientais, como, por exemplo, as catástrofes naturais – inundações, incêndios, secas - e fuga de perigo. Os atos que se seguem não são o resultado de qualquer cogitação prévia que os inicia.
A autogeração, como o outro tipo de motivação humana, é aquele que tem feito o homem progredir até o status a que chamamos de civilizado. Os atos autogerados são os iniciados pela direção consciente voluntária dos poderes mentais do homem.
No Museu Egípcios Rosacruz são vistos exemplos da evolução e expansão do poder criativo do homem. Vemos, por exemplo, numa galeria de exposição, fileiras de objetos de cerâmica pré-histórica de cerca de 8.000 a 10.000 anos. Foram cozidos de modo muito tosco, numa fogueira. Eram feitos à mão, antes que a roda de oleiro fosse inventada. A parte superior é oxidada - escurecida pelo calor. Essa cerâmica era criada apenas para satisfazer uma necessidade, apenas para ter utilidade.
Os processos mentais do homem são numerosos e complexos. Contudo, uma palavra sintetiza melhor aqueles atos pelos quais o homem dirige voluntariamente sua motivação: criatividade.
Para compreendermos a criatividade, podemos abordá-la de três pontos de vista correlatos. São eles o filosófico, o psicológico e sua aplicação. De ordinário, quando pensamos na palavra criar no sentido semântico lato, queremos dizer dar existência a alguma coisa.
ð Mas será uma substancia ou apenas uma forma o que o homem cria?
ð Ou pode uma idéia geral em si ser uma criação, quer ela adquira substancia ou forma?
Examinemos estas palavras separadamente e vejamos se uma delas aproxima-se da idéia geral de criar.
ð Existe uma substância subjacente primária no universo?
ð Em outras palavras, no fundo, será que toda realidade é de um único tipo?
ð Ou será que existem miríades de tipos de substancia no universo sem qualquer relação básica entre si?
Se todas as substancias que vemos fossem tão singularmente diferentes como parecem sê-lo a nossas percepções, não haveria nexo, nenhum elo entre elas. Tal conceito, portanto, suporia um vácuo entre os diferentes tipos de realidade, um estado de não-ser. E não coisa não pode dar origem a alguma coisa. Ela não poderia ser uma condição de onde qualquer coisa poderia ser criada.
Por outro lado, vamos supor que toda realidade no cosmo possa ser reduzida a uma única substância primária; ela é isotrópica, isto é, do mesmo material por toda parte. Se assim fosse, então não se poderia criar absolutamente nada, porque, em essência, todas as coisas estariam fundamentalmente relacionadas. Por certo, nenhuma coisa poderia ser criada fora da substancia primária do universo.
Examinemos agora a forma e vejamos se ela representa um ato de criação. Que é forma? É qualquer coisa que produza sensações dotadas das qualidades que afetam nossos sentidos receptores. Em outras palavras, as formas têm, por exemplo, cor, ou peso, sabor, som, dimensão ou são quentes ou frias, duras ou macias etc. Nada que tenha uma forma carece de todas essas qualidades. Se assim fosse, não a poderíamos experimentar.
Contudo, podemos de tal modo manipular as forças naturais da substancia primária que uma forma parece ser uma criação. Mas, seja qual for a sua aparência, ela realmente possui uma ou mais das qualidades básicas que todas as formas tem. Portanto, do ponto de vista filosófico, o homem não pode criar coisa alguma que não tenha raiz na substancia primária do universo.
Mas o homem cria formas que, em sua inteireza, assumem uma diferença de qualquer coisa anteriormente experimentada. Quanto ao aspecto psicológico, isto constitui simplesmente uma mudança na ordem das coisas e um novo arranjo daquilo que já existe. O automóvel, o avião, o telefone, a televisão e numerosos aparelhos - não são criações absolutas; são extensões e desenvolvimentos de fatores existentes - elementos, forças e fenômenos. O que é novo, então, é a idéia pela qual as coisas ou condições podem assumir, para nós, uma nova aparência ou estado.
A idéia criativa pode surgir objetiva ou subjetivamente. Objetivamente, a idéia criativa é causada sobretudo pela exigência de uma necessidade. É a percepção de alguma insuficiência, inadequação ou imperfeição que incita a pessoa a remediar a condição. Psicologicamente, podemos dizer que é uma insatisfação com um estado existente que proporciona a motivação para criar aquilo que satisfará.
Para elucidar melhor, por exemplo, o que existe para nós pode ser satisfatório na qualidade mas talvez pareça insuficiente em sua quantidade. O desejo de aumentar a quantidade torna-se a motivação para a idéia criativa. Contudo, a necessidade de alguma coisa nem sempre dá origem a uma idéia para sua satisfação. Um homem pode ter uma quantia em dinheiro, porém precisar de mais por uma razão especifica. Não se segue, necessariamente, que lhe fluirá à consciência uma idéia para obtê-lo.
Nesta forma objetiva de criar, a razão desempenha um papel de suma importância. É preciso cogitar sobre a probabilidade de causas que proporcionarão a necessidade.
No raciocínio deve haver uma tentativa de encontrar uma afinidade entre o que é e o que se procura; em termos mais sucintos, de que maneira o que existe pode ser ampliado de modo a prover aquilo que é desejado? Não podem restar grandes extremos entre o que se é ou tem e a meta almejada. A pessoa tem de pensar em como usar suas coisas ou capacidade potenciais como causas ativas das quais podem advir os efeitos desejados. É neste momento que a associação inconsciente tem lugar no subconsciente. Surge uma idéia que, em seu conteúdo, une o conhecimento e as circunstancias presentes com a finalidade buscada. A idéia criativa sugere a maneira como elementos do conhecido, da experiência, podem ser usados para chegar à meta desejada.
A idéia original pode não ser infalível. Todavia, um fracasso ocasiona a análise critica das condições ou pensamentos existentes da pessoa. Ela provoca a seleção de novo ponto de partida para a mente focalizar nele sua atenção.
Não se começa apenas querendo criar. É necessário ter-se uma idéia geral com a esperança de convertê-la em uma realidade. Muitas vezes é preferível primeiro dissecar a idéia daquilo que se deseja; em outras palavras, descobrir os elementos que compõem a imagem mental. Neste processo há a possibilidade de que exista, na mente, uma idéia afim, uma que esteja em harmonia com o conhecimento existente e a meta desejada. A idéia afim, portanto, é uma idéia intermediária. Ela é criativa por ter o poder de fazer com que o conhecido materialize aquilo que é imaginado e buscado.
Em suma, há, portanto, duas abordagens ao método objetivo de se criar com a faculdade da razão. Como dissemos, uma delas é a análise dos potenciais pessoais do individuo para descobrir aquilo que pode transpor a lacuna entre a realidade e o objetivo que ele concebe. A outra maneira está em tentar descobrir, na finalidade desejada, alguma conexão com as experiências e conhecimento da pessoa, dando, assim, origem a idéia criativa afim pela qual se alcança o objetivo.
Temos agora de examinar a fase subjetiva da criatividade. Temos aquelas ideais que lampejam na consciência e são acertadamente chamadas de criativas e são auto-suficientes. Elas corporificam o conteúdo, a originalidade e o método pelo qual devem ser transformadas em realidade. Essas idéias criativas não são trabalhadas; isto é, são espontâneas. Em outras palavras, não há nenhum pensamento consciente anterior sobre elas. Essas idéias criativas tem de ser creditadas ao subjetivo, isto é, aos processos subconscientes da intuição. Os místicos e metafísicos dão-lhe o nome de influxo da Inteligência Cósmica, ou Divina; isto subentende um processo muito diferente, senão independente, das funções mentais comuns. Os psicólogos, por outro lado, usam o termo vislumbre para o fenômeno da intuição. Ambas as definições subentendem uma espécie de super-inteligência.
A idéia intuitiva pode surgir, de repente, na consciência, num composto de várias sensações de experiências anteriores, por mais original que ela possa parecer no momento. A forma que a idéia assume pode parecer nova. Entretanto, ela é composta das qualidades, e elementos de experiências passadas. Uma idéia cujos elementos fossem inteiramente novos ser-nos-ia incompreensível. Seriamos incapazes de identificá-la com qualquer realidade conhecida e, portanto, não teria nenhuma valor para nós.
Na memória do subconsciente há miríades de idéias derivadas de experiências passadas. O registro dessas impressões e suas sensações não era bastante intenso no momento para que a pessoa se tornasse cônscia de sua recepção. Estas idéias relativamente adormecidas não podem ser lembradas voluntariamente, pois ignoramos sua existência; elas são polarizadas. Isto é, podem ser atraídas ou aproximadas por idéias mais dinâmicas que se formam na mente.
Por exemplo, uma idéia que atraia o foco de atenção pela sua perplexidade e sobre a qual a pessoa pode ter-se demorado conscientemente durante algum tempo, será liberada no subconsciente como um trabalho inacabado pela razão, e talvez esquecida objetivamente. A inteligência transcendental, ou subconsciente, começa uma análise da idéia que a mente objetiva pôs de lado. Há, por parte do subconsciente, uma avaliação e ponderação superiores. Esta emprega também o apêndice de idéias e impressões anteriores e já armazenadas no subconsciente. Tem lugar então uma combinação e um relacionamento entre elas e a idéia rejeitada pela mente objetiva.
Parece que a idéia rejeitada é mais dinâmica devido à ponderação anterior que lhe foi dedicada. Ocorre, então, uma escolha e seleção e, finalmente, estabelece-se uma relação harmônica. Isto resulta numa nova imagem mental, uma idéia com intensidade. Esta nova idéia tem estimulo suficiente para se impor à mente consciente com suficiente evidencia de si mesma.
Portanto, a definição de vislumbre dada à intuição parece apropriada. Parece haver um penetrante exame subconsciente da idéia incompleta e inquieta transferida para o subconsciente pela consciência objetiva. O período de tempo decorrido antes que a nova idéia intuitiva penetre na consciência objetiva, varia. Pode ser horas depois que a mente consciente deixou de trabalhar com a seqüência de pensamentos, ou semanas, ou mesmo anos mais tarde. Na verdade, a pessoa pode ter esquecido a idéia original que estimulou os processos subconscientes, de modo que a idéia intuitiva, quando percebida, parece não estar relacionada com qualquer pensamento anterior que a pessoa possa lembrar.
Quanto mais a pessoa cogita sobre o assunto que lhe interessa em particular, mais intenso o poder da idéia quando transferida para a memória. Portanto, é melhor ser capaz, por associação, de atrair da memória no subconsciente aqueles elementos que se coordenarão com ela.
Segundo a moderna pesquisa neurológica e psicológica, o hemisfério direito do cérebro contem os processos pelos quais ocorre a intuição. Em algumas pessoas, este fenômeno psíquico da consciência é mais sensível que em outras. Diz-se que ele é mais sensível nas mulheres do que nos homens.
A criatividade, porém, tem de ser alimentada objetivamente se quisermos que ela se transforme em uma ajuda freqüente. Deve-se cultivar a observação. As observações produzem o material do qual se compõem a experiência e sua idéias. Deve-se tentar atribuir o máximo possível de significado e identidade ao que se percebe. Pela observação surgem os desafios na mente quanto à validade, os contrários e as diferenças de idéias. Estes estimulam a mente, e, por associação, dão origem às idéias criativas e a vislumbres profundos, ou motivação intuitiva.
A meditação, da qual muito se fala hoje em dia, é a prática de se tornar a mente consciente mais receptiva à liberação de impressões do funcionamento do subconsciente. É o fechamento de um grupo de portas e a abertura de outras na mente.
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R.M.L._F.R.C.