8 de fev. de 2010

ASTROMITOLOGIA_A Ciência do Tempo, do Espaço e do Cosmo


Na linha do tempo das disciplinas cientificas, a astromitologia é um campo relativamente novo, mas em rápido crescimento. Esse campo de estudo dedica-se à exploração e análise dos principais mitos históricos como representações de ocorrências astronômicas, e à tentativa de explicar de que modo esses mitos foram adotados por povos antigos como revelações sobre o tempo, o espaço e o cosmo.

A astromitologia concentra sua atenção no vasto lapso de tempo desde o alvorecer da vida senciente até meados do século XVII d.C. Desde então a astronomia tem refletido nossa maneira de pensar, tal como é, baseado nas idéias de Newton e seus sucessores do Iluminismo. Na visão moderna, o cosmo é uma coleção impessoal de “coisas” a serem descritas e classificadas de acordo com sua massa, densidade, peso, cor e radiação de energia. Essas “coisas” são vistas ocupando um dado espaço numa estrutura de tempo relativo.Caracterizamos a nós próprios como amanuenses cósmicos, registrando [o melhor possível dentro dos limites de nossa percepção] as complexas operações de um sistema intricado e em constante fluxo. Tornamo-nos “espectadores” ao invés de participantes.

Tal não acontecia com o homem antigo, que se reconhecia como participante vital num universo orgânico.

Naqueles tempos antigos, o conhecimento cientifico era a esfera reservada ao sacerdócio, disponível apenas para os iniciados. A informação era quase sempre encoberta pelo manto mitológico e sua verdadeira mensagem ou significado era compreendida por uns poucos. Infelizmente, muitos historiadores científicos modernos freqüentemente repudiam esses mitos e verdades ocultas, considerando-os como singularidades de mentes menos sofisticadas. Isto provavelmente se deve à maneira como os cientistas e historiadores de hoje são educados para pensar de modo reto, linear e seqüencial. Isto bastaria se a história fosse uma seqüência clara e ordenada de eventos impressos como pegadas nas areias do tempo. Mas não é isto que acontece.

Tentando construir uma história da astronomia, esperamos apresentar o passado tão fielmente quanto possível. Baseamos nossa apresentação, tanto quanto possível, naquilo que acreditamos seres fatos, e apoiamos esses fatos em evidências bem definidas, tangíveis. Objetos como um tablete de argila com inscrições cuneiformes, da Babilônia, detalhando posições planetárias; uma carta estelar diagonal, pintada na parede de uma tumba no Egito; ou uma ‘clepsidra’ [relógio de água] ateniense, são muito mais fáceis de se identificar, classificar e posicionar num contexto histórico do que mitos como aqueles de um ‘dilúvio universal’; Horus trespassando com uma lança a esposa de seu irmão; ou Cronos mutilando Uranos – ainda que estes mitos sejam dessas mesmas três civilizações.

E, no entanto, os mitos têm os mesmos válidos direitos de serem incorporados à história da astronomia quanto os três itens materiais mencionados. Os três mitos contêm “idéias” astronômicas, enquanto os três itens são “formas” que expressam uma ideação anterior. Os historiadores modernos preferem basear suas apresentações primeiro nas “formas” ou artefatos, e mais tarde, quase que como uma reflexão tardia, explorar as idéias que estão por trás delas. E quando se torna necessário levar em consideração “meras idéias” – idéias em estado puro – muitos historiadores as rejeitam, caso elas não possuam correlação com uma “forma”. Sem objetos físicos que lhes dêem substância verificável, os mitos são com freqüência transladados da “ciência” para a “literatura”.

Nossos métodos modernos de comunicação e nossa maneira de pensar – linear e seqüencial – nos impedem de estabelecer uma conexão adequada com o mítico. Além disso, nossa abordagem “não-insensata” da ciência, com seu dedicado direcionamento para a abertura de novas vistas e sua onipresente orientação para o “agora”, simplesmente obliterou nossa capacidade de perceber prontamente, em primeiro lugar, a base sobre a qual se funda o “agora”. Raramente a mentalidade cientifica sonda com suficiente profundidade a forma mítica, de modo a discernir o subsistente conteúdo científico, oculto sob o manto dos mitos antigos. Como se pode ver, os historiadores em geral, e os astrônomos em particular, infelizmente têm sofrido de um caso avançado de miopia cultural.

A humanidade é filha do cosmo, na medida em que sua evolução segue o curso das leis naturais manifestas. Somos reflexos das leis operativas do cosmo, e estamos física e psicologicamente impressos pela natureza e as pressões naturais, às quais temos respondido com sucesso a fim de sobrevivermos neste mundo às vezes hostil. O homem primitivo aprendeu por observação e teve de se tornar um cientista natural pela mais prática das razões: ele tinha de aprender rápido e ‘lembrar-se’ do que aprendeu, ou morreria por ignorância.

De todos os fenômenos naturais, o céu estrelado com sua repetitiva regularidade era o mais conveniente para estudo. Enquanto outros eventos naturais alteravam-se ou passavam por ciclos de nascimento, vida, decadência e morte, o céu fornecia informação recorrente e intemporal, que impressionavam o homem, tanto física quanto psicologicamente. O céu fornecia o proeminente padrão que a humanidade escolheu para imitar e também elegeu como padrão básico para suas instituições sociais - e esta escolha não foi meramente a externalização de um processo interno. Ela foi a escolha ponderada d cientistas naturais, em sua lida com as pressões da sobrevivência.

O nascer e o pôr das estrelas, do Sol, da Lua e dos planetas, ao seguirem um padrão diário e anual ao longo do céu, fornecia eventos repetitivos, dos quais se derivava uma compreensão das leis naturais. O céu era o laboratório onde experiências recorrentes podiam ser realizadas. Qualquer estrela podia ser observada em relação a qualquer estrela, numa dada noite, e na noite seguinte a relação podia ser reavaliada. Após certo período de tempo, o conhecimento empírico delineava quais estrelas eram aparentemente imóveis ou “fixas” e quais eram “andarilhas” – planetas, que mudavam suas posições contra o plano de fundo ou das estrelas ficas.

O fenômeno celeste imprimiu-se no homem. O período claro do dia era um tempo para caçar e armazenar alimento; a escuridão da noite, um tempo para se esconder dos predadores noturnos. As variações climáticas das quatro estações, por sua vez, incitava o homem à plantação de grãos, à criação de animais, à estocagem da colheita e à busca de proteção contra o inverno. As atividades espelhavam o curso observável da natureza.

As luzes divinas da esfera celeste pareciam compelir ambos, natureza e homem. Com o tempo, essas forças percebidas vieram a ser reverenciadas como deuses, e as ações desses deuses tornaram-se a base para os mitos e as teologias.

O corpo de tradição [fábulas, lendas, composições, folclore], a que comumente chamamos “mito” é um grande armazém de informações. Além disso, contém alguns dos mais profundos e abstratos conceitos e idéias sobre o macrocosmo.

Mitologia é história porque recorda eventos, entretanto não é história na acepção ordinária da palavra, pois as personagens e situações que ali figuram podem nunca ter existido. Mitologia é ciência porque investiga e exprime a natureza e sua origem, embora em sua personificação e deificação da natureza a mitologia não seja ciência, tal como esta é normalmente definida.

A astromitologia procura estabelecer uma ponte entre o homem e o cosmo. Esta ponte é o processo simbólico de que o mito é a principal expressão. E a expressão mitológica é usada pelo todo da humanidade para exprimir o simbolismo que reside em nossa herança psicológica coletiva – uma herança adquirida através de séculos de exploração e contemplação ativas, realizadas pelo cientista natural que habita dentro de todos nós.
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[Texto de: Charles C. Warren]

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MITO E FATO na CIVILIZAÇÃO CLÁSSICA
As linguagens cientificas das antigas civilizações eram suas mitologias, e todos os “fatos” eram dispostos em formas antropomórficas. Assim:

MITO: O deus romano vulcano surpreende sua esposa infiel. Vênus, num encontro com Marte, e os prende em uma rede.
FATO: Vulcano [ com muitos dos atributos de sua contraparte grega, Cronos, deus do tempo], representando o Tempo, prende uma conjunção dos planetas Vênus e Marte em uma rede, referindo-se ao aglomerado estelar chamado Hiades, localizado na constelação de Touro.

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MITO: Faetonte, filho deus-Sol, pega às escondidas a carruagem solar de seu pai para se divertir, mas perde o controle dos fogosos corcéis e se aproxima demasiadamente da Terra, ameaçando queimar todo mundo. No momento crucial, Zeus [rei dos deuses] derruba Faetonte, salvando o mundo, permitindo que a carruagem solar retorne à sua rota normal e segura através do céu.
FATO: A queda de Faetonte marca o fim da helênica Era de Ouro dos deuses, a grande era mundial quando a Via Láctea [ligando Gêmeos e Sagitário] coincidia com as posições do Sol equinocial [no Hemisfério Norte]: equinócio vernal em Gêmeos, equinócio outonal em sagitário, período em torno de 6000-6400 a.C.

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MITO:Zeus, desgostoso com o banquete canibalístico que foi lhe servido por Licaon, vira a mesa em sua fúria.
FATO: Zeus, virando a mesa, pôs fim à Era Cósmica seguinte – a Era de Prata – quando Touro e Escorpião tomaram o lugar de Gêmeos e Sagitário, na regência dos equinócios. A mesa é uma metáfora para o Mundo, segundo a compreensão dos antigos; um mundo que incluía não apenas nossa Terra, mas os domínios do espaço, abrangendo as constelações zodiacais e também os planetas que pareciam se mover contra esse fundo estelar. O tampo da mesa – a mítica Terra “achatada”, equivalente ao mundo expandido – é o reino dos seres viventes, incluindo os deuses [Sol, Lua e os cinco planetas visíveis] e a humanidade. As pernas da mesa representam os quatro pontos cardeais da Terra – norte, leste, sul e oeste – e as quatro posições do Sol que delimitam as fronteiras desse mundo metafórico, que são os equinócios de primavera e outono, e os solstícios de verão e inverno.






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